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Carreta-Carreta, nove anos de amor às tartarugas em Cabo Verde

Ricardino Pedro

A Associação Ambiental Carreta-Carreta luta há nove anos por proteger as tartarugas no município cabo-verdiano de Santa Cruz, um amor intenso pela preservação que luta contra os caçadores e falta de apoios

Fundada há nove anos por jovens de Santa Cruz, a Associação Ambiental Carreta-Carreta desenvolve as suas atividades de proteção das tartarugas marinhas comuns na parte sul da praia de Areia Grande, junto a localidade de Achada Igreja, no interior da ilha de Santiago.

A receção é feita por José António Cardoso, 36 anos, um dos voluntários que considera a tartaruga “algo bonito” para se ver. “São-nos próximo, já nos conhecem e não se afastem”, disse à agência Lusa o também tesoureiro da associação ambiental.

José António disse ter orgulho de proteger as tartarugas, mas têm muito por lamentar, começando pela escassez de apoios. “O que vale é nosso amor pelo trabalho. Cada um ajuda com o pouco que tem”, afirmou.

Sem grandes ajudas governamentais, o tesoureiro disse que a associação, que protege ainda os pássaros em duas lagoas ao lado, tem batido também à porta da Câmara Municipal, mas só depois de muita insistência é que se consegue algum apoio.

“Às vezes dão-nos quando passamos muito tempo a correr atrás deles, mas têm o dever de nos ajudar antes de chegarmos neles”, considerou José António, que este ano tem outro problema para resolver, a escassez de voluntários.

O grupo conta com 16 voluntários, mas José António notou que este ano o número de novos apoiantes não chegou a 10, e três já desistiram por falta de alimentação para aguentarem os turnos de dia e de noite na extensa praia.

Além disso, referiu que este ano a associação depara-se com o aumento de caçadores desta espécie protegida, e um dos motivos é a crise provocada pelo novo coronavírus.

Desde 01 de junho, dia que começou a nova época de desova das tartarugas marinhas, indicou que a associação já recuperou três tartarugas, mas outras duas foram mortes por predadores.

“Este ano temos poucos voluntários por isso estamos com muitas dificuldades. Precisamos de mais voluntários para proteger as tartarugas”, apelou, sem tirar os olhos dos mais de 400 ninhos cercados por uma rede e marcados com pedaços de madeira na areia negra.

A legislação cabo-verdiana prevê penalizações para a captura, venda e consumo de produtos derivados de tartarugas, mas José António disse que a lei não está a ser cumprida porque ninguém é preso por apanhar a espécie.

O ativista é taxativo e exige pelo menos 10 anos de cadeia para os predadores. “Não é exagerado. Ninguém pode apanhar. Estamos aqui a fazer o nosso trabalho, com sacrifício, sem lucro, sem nada. Se pegarem tartarugas e não são punidos, o nosso trabalho fica sem valor”, sustentou.

Outro dos jovens de Santa Cruz que fundaram a associação é Gerson Furtado, 30 anos, que de dia trabalha como canalizador e eletricista, e à noite junta-se ao grupo de amigos no acampamento feito de palha, paus e madeira na praia de Areia Grande para proteger as tartarugas.

Tem sido assim desde a criação da associação, segundo o voluntário, que descreveu a experiência até hoje como “alegria e sucesso, lutando pela causa de amor à tartaruga e ao ambiente”.

“Mesmo com as dificuldades, estamos dispostos a fazer tudo pelas tartarugas”, assegurou o também presidente do Conselho Fiscal da Associação, que fala dos mesmos problemas do colega de missão, mas destacou o recorde de ninhos este ano, mais de 420 ninhos a meio da campanha.

Cada ninho, indicou, tem entre 60 a 120 ovos, e ao fim de 45 a 50 dias, os filhotes nascem e cerca de 70% conseguem chegar ao mar, uma das derradeiras fases da proteção.

Gerson Furtado não consegue encontrar uma explicação para o maior número de ninhos que a associação regista em nove anos de atividade, dizendo apenas que a natureza funciona de uma forma misteriosa.

“Pode ser algum fenómeno natural que está a acontecer e que não conseguimos prever”, afirmou o voluntário, que não esconde a alegria do trabalho que faz, tendo chegado a ter noites em que conseguiu ver 20 tartarugas para desova na praia, que também são apreciadas por visitantes.

Além da canalização e eletricidade, Gerson Furtado não se vê a fazer outra coisa que não cuidar das tartarugas, estar por dentro do trabalho com todo o seu amor.

A população de tartarugas marinhas ‘Caretta caretta’ de Cabo Verde é a terceira maior do mundo, sendo apenas ultrapassada pelas populações na Florida (Estados Unidos) e em Omã (Golfo Pérsico).

O período de desova desta espécie começou a 01 de junho e vai pelo menos até novembro, e Carreta-Carreta é uma das muitas associações ambientais que vigiam as praias do país para defesa e proteção desta espécie ameaçada.

Em 2018, o país, que contabiliza 182 quilómetros de praias vigiadas em todo o território, registou 109 mil ninhos de tartaruga, um número recorde e quase três vezes maior do que o ano anterior.

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