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Acordo de paz em Moçambique está refém da Junta Militar da Renamo

Acordo de paz assinado a 6 de Agosto de 2019 em Moçambique está a ser “bem implementado”, mas o balanço final está “refém” de uma solução para a contestação protagonizada por uma dissidência militar da Renamo.

A 6 de agosto de 2019, o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, e o líder da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), principal partido da oposição, Ossufo Momade, assinaram em Maputo o Acordo de Paz e Reconciliação Nacional para acabar formalmente com confrontos entre as Forças de Defesa e Segurança (FDS) e o braço armado do principal partido da oposição.

Calton Cadeado, especialista em Paz e Conflitos na Universidade Joaquim Chissano, instituição estatal, considera que a implementação em curso do processo de desarmamento, desmobilização e reintegração (DDR) está a ser um grande avanço e sinal de confiança entre o Governo e Renamo.

“A implementação do DDR significa que a Renamo aceita abdicar de um instrumento de pressão decisivo: a força militar”, considerou Calton Cadeado, em declarações à agência Lusa.

O sentimento otimista dos guerrilheiros da Renamo, até agora abrangidos pelo DDR, traduzem um forte compromisso com o fim da guerra, observou.

“Os guerrilheiros da Renamo sempre foram um fator crucial na correlação de forças com o Governo e se eles querem voltar para casa, como dizem em entrevistas à comunicação social, isso mostra que este acordo de paz tem um ingrediente fundamental para ser bem-sucedido”, salientou o académico.

Cadeado destacou o facto de a Renamo ter aceitado integrar todas as instituições do Estado e de soberania a que tem direito como outro indicador de que o acordo de paz poderá vingar.

“Pela primeira vez, temos o líder da Renamo no Conselho do Estado e não temos um retorno à guerra após as eleições, como aconteceu no passado”, assinalou.

Apesar do otimismo, Calton Cadeado apontou os ataques armados da Junta Militar da Renamo como uma ameaça ao acordo de paz, porque o grupo está ativo e a criar focos de instabilidade.

“O objetivo primordial do acordo era o fim da violência armada e esse objetivo nunca será plenamente alcançado, enquanto não se resolver esse apêndice do problema, que é a junta militar”, frisou.

A solução, prosseguiu, passa por negociações com a junta, porque uma estratégia de “liquidação militar” pode levar a uma escalada.

Por seu turno, Muhamad Yassine, ex-deputado da Renamo e especialista em Relações Internacionais, defendeu que o acordo está a decorrer “a contento”, apesar de uma “lentidão natural”, tendo em conta a complexidade do processo.

“A nota de maior realce no acordo é que há um DDR em curso e com resultados visíveis”, destacou à Lusa, Muhamad Yassine.

Yassine assinalou que “o contencioso militar” manteve sempre o país sobre o espetro da guerra, sendo a implementação do DDR um indicador da vontade de encerrar a instabilidade militar.

O antigo deputado, docente na Universidade Joaquim Chissano, também referiu a Junta Militar da Renamo como um empecilho ao sucesso do acordo, defendendo uma solução negociada para a resolução do problema.

“O sucesso deste acordo está refém de uma solução negociada para a junta militar, porque está a torpedear o processo”, considerou.

Guilherme Júnior, analista e docente de Direito na Universidade Eduardo Mondlane (UEM), a maior e mais antiga de Moçambique, classificou como “bem encaminhado” o Acordo de Paz e Reconciliação Nacional, mas apontou a Junta Militar da Renamo como um “desafio difícil”.

“Há um desafio que está a ser ultrapassado, que é o do DDR, como se vê na desmobilização que está a acontecer com os guerrilheiros da Renamo”, afirmou Guilherme Júnior.

Mas as ações da Junta Militar da Renamo ensombram os progressos em curso, acrescentou.

“As lideranças políticas envolvidas têm de encontrar uma solução equilibrada e racional, sem descartar a necessidade de ações de defesa e segurança que são ameaçadas por aquele grupo”, sustentou Guilherme Júnior.

Guilherme Júnior defendeu que a abordagem de proximidade e de alguma informalidade que tem sido seguida pelo chefe de Estado e pelo líder da Renamo criaram uma confiança que pode contribuir para o sucesso do Acordo de Paz e Reconciliação Nacional.

No quadro do DDR, mais de 500 guerrilheiros da Renamo entregaram as armas.

Depois de um arranque simbólico no último ano, o DDR esteve paralisado durante vários meses, tendo sido retomado em 04 de junho deste ano, com a ambição de abranger 5.000 membros do braço armado do maior partido da oposição em Moçambique.

A autoproclamada Junta Militar contesta a liderança do partido e o acordo de paz assinado em agosto do último ano, sendo acusada de protagonizar ataques visando forças de segurança e civis em aldeias e nalguns troços de estrada da região centro do país.

No norte do país, mais concretamente na província de Cabo Delgado, ataques de grupos armados desde 2017 já fizeram pelo menos mil mortos, entre civis, militares moçambicanos e vários rebeldes, e estão a causar uma crise humanitária que afeta mais de 700.000 pessoas.

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