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Restrições a residência atrasam diversificação

Líderes da comunidade empresarial alertam para a necessidade de relaxar os requisitos para atribuição de residência a quadros estrangeiros qualificados; se pretende o Governo pretende mesmo contrariar a dependência do jogo e do turismo

Nelson Moura

A luta de Macau para diversificar a economia, para além do jogo, requer mudanças políticas audaciosas, segundo vários líderes empresariais. O Governo precisa simplificar processos de visto para profissionais estrangeiros e reduzir atrasos burocráticos; se é que quer competir com outros grandes centros económicos da região. Esta tese foi quarta-feira defendida por líderes de várias câmaras de comércio, na mais recente edição MBtv Debates, intitulada “Macau SAR aos 25 Anos e Além – Tomando o Pulso da Economia da Cidade”, na Fundação Rui Cunha.

A opinião dos convidados é unânime: nos últimos 25 anos, muita coisa mudou. Com o impulso da liberalização da indústria do jogo, em 2001, o nível de vida aumentou e Macau tornou-se na segunda jurisdição mundial com o maior PIB per capita. No entanto, olhando para o futuro, muitos representantes empresariais na cidade chamam à atenção para os efeitos negativos de um sistema de residência restritivo, que o corta acesso a profissionais qualificados estrangeiros. O que prejudica o desenvolvimento e a competitividade da cidade, mesmo na região em que está inserida. Daí os votos para que a nova Administração de Sam Hou Fai consiga aligeirar o problema.

[Plano de atração de talentos] começa da premissa errada de que todos querem vir para Macau

Rui Pedro Cunha, presidente da Câmara de Comércio Europeia

Rui Pedro Cunha, presidente da Câmara de Comércio Europeia de Macau, enfatiza que a estratégia de captação e retenção de talentos em Macau precisa de uma reforma significativa. “O plano atual, lançado no ano passado, é bom, mas não é suficiente”, sustenta. “Começa da premissa errada de que todos querem vir para Macau e, portanto, precisamos impor requisitos muito elevados e fazer triagem.”

O Governo lançou em julho do ano passado um novo plano de atração de talentos, centrado em candidatos com habilitações que possam incrementar as quatro indústrias consideradas chave para a diversificação económica: ciência, tecnologia, fintech, e eventos de grande escala – sobretudo nas áreas da cultura e desporto. Mais de mil pessoas já se candidataram ao esquema; entre as quais 80 por cento do interior da China, 10 por cento de Hong Kong, e outros 10 do resto do mundo. A propósito, Cunha acrescenta que o Governo deve facilitar a aplicação de vistos de trabalho e residência para profissionais estrangeiros, observando que “profissionais altamente qualificados, mesmo convencidos a vir, acabam por não vir; ou porque não são autorizados, ou porque apenas recebem um ‘blue card’. Quando era estudante, nos anos 80, obter um diploma universitário em Macau não era uma opção. Agora temos mais de 50.000 estudantes em Macau e universidades bem-conceituadas. Isto é algo que fizemos bem; estudando o que era feito noutras regiões e atraindo profissionais de topo no ensino”, conclui Cunha.

Se não conseguirmos competir, vamos atrair pessoas, mas não as melhores nas suas áreas

Keith Buckley, presidente da Câmara de Comércio Britânica

Keith Buckley, presidente da Câmara de Comércio Britânica, explica que Macau tem de “pensar fora das suas fronteiras” e atrair profissionais, que tanto podem ir para Singapura, como para Hong Kong, o Abu Dhabi: “Se não conseguirmos competir, vamos atrair pessoas, mas não as melhores nas suas áreas”, realça o empresário da construção civil. O paradoxo da questão, resume Buckley, é que sem indústrias desenvolvidas não é possível atrair profissionais de topo; mas sem eles é impossível desenvolver indústrias de topo. Nó górdio que não é fácil resolver sem a liderança das autoridades da RAEM: “Quando cheguei a Macau, há 20 anos, pensei que seria como Singapura; afinal, não era tão organizado. E a minha experiência de trabalho em várias jurisdições diz-me que os governos precisam de ter vontade de fazer as coisas acontecer”.

Entrave à diversificação

Os líderes empresariais presentes no debate são unânimes na crítica a restrições que impedem a contração de talento estrangeiro.

Temos um esquema de talentos que é uma boa ideia; mas, na prática, pode não estar a funcionar

Billy Chan, presidente da Câmara de Comércio Australiana

Billy Chan, presidente da Câmara de Comércio Australiana, aponta como exemplo a dificuldade em atrair académicos de topo para o Faculdade de Ciência de Saúde da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau: “Temos um esquema de talentos que é uma boa ideia; mas, na prática, pode não estar a funcionar. Na Universidade, fazemos pesquisa médica e precisamos de professores e investigadores; temos de os procurar noutros países, como a Malásia ou Singapura. Contudo, muitas universidades na Ásia oferecem-lhes contratos de trabalho de vários anos, permitem-lhes que tragam as suas famílias e façam planos a longo prazo. Em Macau trabalham talvez durante um ano e depois partem. Se não mudarmos este sistema, será difícil atrair pessoas. Não estou a falar do Elon Musk, mas de profissionais médicos, cientistas e enfermeiros”. A título de exemplo, Chan menciona o caso recente de alguém que a Universidade quis contratar, mas que preferiu ir para Abu Dhabi. Não porque fosse melhor a oferta salarial, mas porque teve acesso facilitado aos direitos de residência.

Temos a infraestrutura, temos tudo para atrair empresas e profissionais; a única coisa que nos impede é a questão da residência

Carlos Cid Álvares, presidente Câmara de Comércio e Indústria Portugal-China

Carlos Cid Álvares, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-China, acredita que o sistema fiscal favorável e a sua localização estratégica fazem de Macau um lugar ideal para atrair multinacionais e profissionais qualificados. “Temos a infraestrutura, temos tudo para atrair empresas e profissionais; a única coisa que nos impede é a questão da residência”.

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