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Sucesso de “Black Myth: Wukong” ilustra importância dos videojogos no ‘soft power’ chinês – especialista

Um especialista português radicado na China afirmou à Lusa que a indústria de videojogos pode servir como instrumento para Pequim projetar influência cultural, numa altura em que o título chinês “Black Myth: Wukong” bate recordes no setor.

“Os videojogos, mais que o cinema ou a música, são de facto a grande potência atual do ‘soft power’ [poder de influência] chinês”, explicou Daniel Camilo, radicado desde 2012 em Shenzhen, no sudeste da China.

“Da mesma forma que o público se familiarizou com o Japão devido às suas exportações culturais nos anos 1980 e 1990, a China está a seguir o mesmo caminho, com ênfase nos videojogos”, descreveu.

“Black Myth: Wukong” tornou-se na terça-feira, dia do seu lançamento, o título com o maior número de sempre de jogadores simultâneos na plataforma Steam, líder mundial na distribuição de videojogos.

Produzido pela empresa chinesa Game Science, com um custo de 400 milhões de yuan (51 milhões de euros), o jogo inspirou-se na “Viagem ao Oeste”, obra clássica da mitologia chinesa.

Na sexta-feira, na rede social X, foi avançado que o jogo tinha vendido 10 milhões de cópias em todo o mundo desde o seu lançamento. A popularidade do jogo de ação teve impacto imediato no mercado bolsista: as ações do grupo Huayi Brothers, ligada ao desenvolvimento do jogo, subiram 20%.

O sucesso pode incentivar a indústria dos videojogos na China a criar mais títulos AAA, que são produções de alto orçamento e alta qualidade, comparáveis às grandes produções cinematográficas, segundo explicou à Lusa Daniel Camilo.

É um enorme marco e mudança de paradigma até para a forma como o resto da indústria vê a China daqui para a frente”, apontou o português, que acompanhou o desenvolvimento do setor na China na última década.

Pequim, que há muito se queixa que a imprensa ocidental domina o discurso global e alimenta preconceitos contra a China, tem investido milhares de milhões de dólares para elevar a imagem do país à altura do seu poder económico e militar.

Mas, ao contrário do Japão e da Coreia do Sul, cujas obras cinematográficas, desenhos animados e a música conquistaram milhões de fãs em todo o mundo, o gigante asiático carecia de uma indústria de entretenimento com sucesso além-fronteiras.

Produzido pela empresa chinesa Game Science, com um custo de 400 milhões de yuan (51 milhões de euros), o jogo inspirou-se na “Viagem ao Oeste”, obra clássica da mitologia chinesa.

“Acho que o motivo é bastante óbvio: a censura proíbe que na China se toque em vários temas”, observou o português.  “Os bons filmes chineses estão quase todos banidos na China e as megaproduções que fazem sucesso internamente têm geralmente um tom nacionalista que não interessa a ninguém lá fora”, notou.

E prosseguiu: “A música é ainda pior, ainda mais restringida: nunca vão ter aqui uma banda tipo Sex Pistols”. Na indústria dos jogos, os reguladores chineses têm, no entanto, uma postura “mais relaxada” sobre o conteúdo, que é também menos suscetível de tocar em temas que incomodem Pequim.

O cinema toca em questões realistas da sociedade. Os jogos são mais fantasiosos”, sublinhou Daniel Camilo.

Grandes grupos chineses, como a Tencent, Netease ou Bytedance (detentora da plataforma de partilha de vídeos TikTok) são já líderes num setor que faturou 184 mil milhões de dólares (165 mil milhões de euros) a nível mundial, em 2023, segundo a consultora especializada Newzoo.

Em 2021, as autoridades chinesas restringiram o acesso dos menores de idade aos jogos de computador a três horas por semana – de sexta a domingo, entre as 20:00 e as 21:00 -, com o objetivo declarado de “proteger eficazmente a saúde mental e física” e o “crescimento saudável” dos jovens.

A regulação fez de 2022 o ano mais difícil para a indústria na China, com uma contração das receitas, obrigando os produtores locais a focarem-se no mercado externo. “O mercado chinês é o maior do mundo, mas é simultaneamente um dos mais limitados e restritos”, observou o especialista.

Licenciado em Estudos Orientais pela Universidade do Minho, Daniel Camilo visitou a China pela primeira vez em 2008, para realizar um ano de intercâmbio na cidade portuária de Tianjin, no nordeste do país.

Entusiasta de videojogos e comentador frequente na rede social X (antigo Twitter), o português passou a ser frequentemente citado na imprensa internacional, incluindo BBC, Voice of America, Newsweek ou The Guardian, sobre os desenvolvimentos da indústria na China.

“Há um vazio informativo, sobretudo em inglês, sobre a atualidade na China fora do âmbito político ou macroeconómico”, justificou.

Platafroma com Lusa

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