A guerra entre a Ucrânia e a Rússia estabeleceu novas óticas quanto à estratégia energética a adotar no futuro próximo, tendo em conta a dependência da Europa face ao gás natural russo. Para empresários de Portugal, este conflito revela a urgência do país em acelerar a transição energética
Pedro Norton, CEO da Finerge, refere que Portugal possui “condições únicas na produção de energia solar e eólica e poderia ser um exportador de energia renovável se não houvesse as limitações das interligações elétricas, nomeadamente entre Espanha e França”, segundo noticiou o Jornal de Negócios.
As restrições destas interligações “limitam e transformam”, em termos energéticos, Portugal e Espanha “numa ilha ibérica”, segundo o responsável máximo da empresa líder na produção de energia eólica, aquando da sua participação no painel “Descarbonização: como vai diminuir a pegada de CO2?” da Grande Conferência Negócios Sustentabilidade.
O mesmo responsável esclarece que, durante anos, a Europa foi o parente pobre da reflexão sobre a energia, muito centrada no combate e mitigação das alterações climáticas. Como tal, Portugal tem de aproveitar esta reflexão sobre a independência e a segurança energética no velho continente.
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As reações em torno do excesso de gás russo presente na Europa irão gerar discussões no curto prazo, como aquelas já desencadeadas na Alemanha e em Itália, acerca do regresso do uso do carvão e da aposta na energia nuclear, revela o representante da Finerge. Porém revela, que deverão ser “reações de curto prazo”. “A médio e longo prazo, há tendência de aceleração da transição energética e do investimento em produção de energia renovável, hidrogénio verde”, sublinha.
Pedro Norton deu o exemplo do alerta da Comissão Europeia em 2014, ano em que a Rússia invadiu a Crimea, acerca da subordinação às importações de gás russo. As importações na altura rondavam os 40 por cento, tendo subido mais cinco pontos percentuais desde então.
Energia “barata”
Por sua vez, Miguel Stilwell d’Andrade, CEO da EDP, sugere que a independência energética de Portugal e da Europa passe pela produção “de energia de forma endógena através da eólica, da solar, da hídrica: melhores alternativas do que as importações de carvão, petróleo e gás”.
Stilwell d’Andrade considera que as energias renováveis são as tecnologias mais baratas de produção de energia hoje em dia, daí ser necessário “desbloquear licenciamentos, interligações, assegurar um articulado regulatório estável. Se houver isto em termos de execução as empresas cá estão para executar”.
Além disto, o empresário foca-se nas energias renováveis porque “têm um preço perfeitamente previsível”. “Fez-se recentemente um leilão com os preços para os próximos 15 anos e poderia ter sido para 30 anos, porque seria um preço perfeitamente conhecido à partida e não haveria variabilidade como existe em relação ao Brent, ou ao gás”, explica o mesmo responsável.
A AIE tem uma projeção de uma procura superior a 50 por cento até 2050, liderada pelo aumento da procura na Ásia. Isto leva a que a eficiência energética seja cada vez mais
imprescindível. Filipe Duarte Santos, presidente do Conselho Nacional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, sustenta que os combustíveis fósseis constituem 70 por cento das fontes primárias globais de energia desde 1970.
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Já Júlia Seixas, pró-reitora da Universidade Nova de Lisboa e presidente do júri do painel que moderou o debate, especifica que Portugal precisa de investir 70 mil milhões de euros em eficiência energética nos edifícios.
A transição energética justifica os preços altos de energia, segundo José Martos, diretor-executivo da Saint Gobain. A Saint-Gobain possui produtos e soluções de eficiência energética, especialmente na habitação, que representa “cerca de 40 por cento das emissões da União Europeia, 12 por cento na fase de construção, 28 por cento na fase de utilização dos edifícios”. “Se queremos atingir uma neutralidade carbónica temos de descarbonizar a habitação”, salienta o responsável da empresa sediada em França.
José Martos especifica que existe uma oportunidade de “mobilizar um setor que cada vez mais justifica a melhoria de eficiência energética para resolver o problema da pobreza energética e para criar uma dinâmica de economia circular”. “No processo de construção pode-se utilizar materiais reutilizáveis. Esta situação pode ser um acelerador da descarbonização”, esclarece.
Contudo, o representante da Saint-Gobain considera fundamental a existência de alterações quanto aos incentivos da eficiência energética, referindo que a parte mais importante “para ser reformada e fazer um edifício mais eficiente é a envolvente”.
“Se não conseguirmos isolar a envolvente, a energia poupada por equipamentos mais eficientes vai perder-se”, enaltece.
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