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Analista diz que fragilidade das instituições explica nova crise

O economista Jonuel Gonçalves defende que a atual instabilidade na Guiné-Bissau, onde a dissolução do parlamento foi anunciada esta segunda-feira, reflete a “fragilidade das instituições” e pode ser a gota de água que vai perturbar a África Ocidental.

“A primeira constatação é que a Guiné-Bissau tem alguns intervalos de calma e depois tem uns momentos de agitação que vêm geralmente das áreas do poder, porque o entendimento entre as diversas forças políticas está longe de ser encontrado, na medida em que as instituições são frágeis. Quer dizer, as pessoas contam mais do que as instituições”, disse Jonuel Gonçalves, num comentário à decisão do Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, em dissolver o parlamento.

Para Jonuel Gonçalves, “não há como conter determinadas rivalidades dentro da Guiné-Bissau enquanto não houver instituições que funcionem como amortecedor disso”.
Sissoco Embaló anunciou a dissolução do parlamento, já contestada pelo presidente deste órgão, Domingos Simões Pereira, e justificou a medida com uma grave crise institucional no país, na sequência de confrontos entre forças de segurança, que considerou “um golpe de Estado”.

Os confrontos sucederam-se à detenção do ministro das Finanças e do secretário de Estado do Tesouro por um alegado caso de corrupção e colocaram frente a frente a guarda da Presidência e a Guarda Nacional, depois desta ter ido buscar os dois governantes às celas da Polícia Judiciária.

“Se introduzimos elementos emocionais, que contam muito em política, a gente pode dizer duas coisas. Em primeiro lugar, um processo por corrupção em relação a membros do Governo – atenção que o Governo não é da mesma linha do Presidente – esse processo levou mesmo lugar a uma espécie de intervenção militar armada, não só armada, mas armada com disposição de combate e isso, logicamente, que criou na população um clima de muita insegurança”, explica Jonuel Gonçalves.

“Ao mesmo tempo, o Presidente Embaló não estava em Bissau. Ele estava no Dubai e parece que ficou ainda mais irritado por esse facto, porque tudo se passou na sua ausência e porque lhe criou problemas de prestígio perante os seus colegas”, acrescenta.

Para Jonuel Gonçalves, o Presidente da República aproveitou os confrontos em Bissau, registados quinta e sexta-feira na capital guineense, como pretexto para dissolver o parlamento.
Mas a decisão, considera, é desproporcionada. “Está a criar um problema. Uma reação daquele tipo devia até gerar, digamos, o efeito contrário, quer dizer, um outro governo”, adianta.
“Portanto, o problema que eu vejo na Guiné-Bissau é a grande fraqueza das instituições. Os tribunais não funcionam, o próprio Parlamento, vamos ver se ele resiste”, questiona.
Quanto aos desenvolvimentos da crise, em que efetivos militares passaram hoje a controlar a televisão e a rádio nacionais, Jonuel Gonçalves classifica-a como “uma medida de segurança, digamos, de rotina”.

“Não é função do Exército fazer coisas a nível interno. Agora se as Forças Armadas ocupam o Parlamento é um golpe de Estado é um golpe de Estado desencadeada a partir do próprio poder”, defende.

No âmbito da sub-região, Jonuel Gonçalves salienta que existem quatro regimes militares, saídos de golpes de Estado – Mali, Burkina Faso, Níger e Guiné-Conacri -, e acresce os recentes desenvolvimentos na Serra leoa e agora Guiné-Bissau.

“Há quatro regimes militares na região e há dois países que tiveram recentemente pressões militares muito fortes. Uma foi dada na Serra Leoa também para libertar presos e outra na Guiné-Bissau. Na Guiné-Bissau inicialmente para libertar presos e agora com as Forças Armadas a fazerem papel interno. Então a região está toda a ficar agitada. Este caso da Guiné-Bissau, que até é dos países mais pequenos da região, é aquela gota de água que pode agitar a área toda”, antecipa.

Jonuel Gonçalves conclui, em declarações à Lusa, que a Guiné-Bissau ainda não atingiu sequer os mínimos para a sua construção enquanto Estado.

“Os Estados constroem-se no longo prazo, mas no curto prazo há um mínimo que tem que ser obtido. A Guiné-Bissau tem que alcançar esse mínimo e não chega lá. Quer dizer, a gente vê o continente africano como é que ele está e a Guiné-Bissau não é caso único, há muitos outros assim e até Estados mais antigos. Mas é um facto que há aqui um problema de tempo, de tempo, por um lado, e de ligações interpartidárias, de formação de alianças e de garantias de base que a gente não vê quando é que a Guiné-Bissau pode chegar lá”, considera.

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