O anúncio do ministro das Infraestruturas provoca a mais grave crise interna na governação desde que António Costa é primeiro-ministro. Chefe do Governo só avança agora depois de acordo com PSD.
Lisboa adormeceu na quarta-feira com a perspetiva de ter três aeroportos (Portela agora, Montijo daqui a quatro anos e finalmente Alcochete, definitivamente, a partir de 2036) e ficou ontem outra vez com apenas o que existe, esgotado e (de novo) sem nenhuma solução. Pelo meio, desenvolveu-se uma incrível sucessão de notícias, numa crise interna no Governo sem igual nos sete anos que António Costa já leva como primeiro-ministro (PM) – e inimaginável, governando com maioria absoluta.
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Tudo começou na quarta-feira, quando o ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, decidiu anunciar a nova solução do Governo para resolver o problema do esgotamento do aeroporto da Portela: uma estrutura provisória a montar no Montijo até 2026 e uma definitiva em Alcochete até 2036, desativando-se então a Portela.
O anúncio foi feito pelo ministro num encontro com jornalistas e depois em entrevistas à RTP e à SIC. E tudo sem consultar o primeiro-ministro (foi o que este disse) e assumidamente sem informar previamente o Presidente da República, porque “não tem de o informar de tudo”. Pedro Nuno Santos fez também questão de, nesse anúncio, descartar algo que o PM tem sempre considerado essencial: a necessidade de qualquer decisão de futuro só ser tomada depois de um acordo com o PSD. Segundo argumentou, o futuro líder do partido, Luís Montenegro, já se tinha “posto fora” de uma solução e “nós temos de decidir, acabou!”.
Costa, ausente em Madrid, na Cimeira da Nato, nem queria acreditar no que estava a acontecer. Falou com o Presidente da República e assegurou-lhe que o problema seria resolvido.Ontem de manhã, pelas 9.45, chegou então ao mail dos jornalistas a reação do PM – absolutamente surpreendente, visto que ninguém imaginava que Pedro Nuno Santos tinha anunciado a nova solução para o aeroporto sem se combinar previamente com o chefe do Governo.
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António Costa “determinou ao ministro das Infraestruturas e da Habitação a revogação do despacho ontem publicado sobre o Plano de Ampliação da Capacidade Aeroportuária da Região de Lisboa”. Além disso, reafirmou que “a solução tem de ser negociada e consensualizada com a oposição, em particular com o principal partido da oposição e, em circunstância alguma, sem a devida informação prévia ao senhor Presidente da República”. E disse também que é a ele que compete “garantir a unidade, credibilidade e colegialidade da ação governativa”.
Dito por outras palavras: desautorizou categoricamente o ministro das Infraestruturas, fazendo muitos acreditar que, postas as coisas assim, esta súbita crise só se poderia resolver de uma de duas maneiras: ou demitindo Pedro Nuno Santos ou forçando-o a demitir-se.