O economista Albano Martins diz que o Governo fez bem em agir de forma rápida ao lançar um pacote de medidas para tentar mitigar a crise gerada pelo coronavírus em Macau, mas entende que a maioria delas só vai ter efeitos no “pós-tormenta”, com pouco impacto no imediato. Defende que, no curto-prazo, seria mais eficaz atribuir um subsídio a fundo perdido às pequenas e médias empresas (PME), baseado na declaração de imposto profissional de 2018, para pagar dois ou três meses de salários.
“O subsídio a fundo perdido é uma medida de caráter excecional, para momentos excecionais. Neste caso estamos a falar de um fundo para pagar salários aos trabalhadores. E esta é, sem dúvida, a opção mais fácil, rápida e segura de ajudar as pequenas e médias empresas (PME) – o tecido empresarial da cidade”, defende.
E como ser justo na atribuição desse subsídio? Albano Martins tem poucas dúvidas. “Estamos em 2020 e a última lista de imposto profissional apresentada reporta a 2018. Pegava-se nessa listagem – Governo e administração fiscal sabem o que as empresas gastaram em salários – e em função dos dados atribuía-se um subsídio para assegurar salários, por exemplo, de três meses. Não há hipóteses de aldrabar. Obviamente, com condições fixadas pelo Governo”.
Isto porque, para o especialista, “em política económica é necessário atuar rapidamente em momentos de crise e o Governo fez isso”, embora considere que “grande parte das medidas está virada para ajudar no pós-crise e não no imediato”.
“Na crise, as PME – o tecido empresarial da cidade – vão passar por problemas complicados. Não há procura, mas há salários e rendas para pagar. Estas são as grandes despesas a suportar. Estamos perante aquilo que pode classificar-se como as despesas estruturais das PME, as quais precisam de ser resolvidas no imediato”, esclarece.
Para Albano Martins não basta, assim, olhar para as medidas e dizer que “são positivas. É preciso pensar na maneira mais eficiente de as tornar mais efetivas”.
“Ora, as empresas precisam de fundo de maneio para se segurarem. E não há qualquer hipótese de o conseguirem sem ser através de subsidiação a fundo perdido”, sinaliza.
O economista reconhece que há quem discorde da solução que defende, com o argumento de que “não acontece nos países capitalistas”, mas contrapõe: “Macau é um caso à parte, é uma cidade muito pequena, tem uma condição muito particular e não é igual a um país. Por isso pode fazê-lo”.
“Os subsídios a fundo perdido são a melhor maneira de segurar as empresas para que sobrevivam. E, sobrevivendo, sobrevive o trabalho. E essa é que é a questão melindrosa. No meio disto tudo, todas as medidas tomadas pelo Governo vão levar tempo a ser efetivadas. E quando começarem a ser efetivadas, provavelmente já as empresas estão com a corda na garganta”, alerta.
“As pessoas precisam de comer”.
E justifica: “Uma boa empresa tem, em regra, um fundo de maneio para três meses. Já uma PME tudo o que ganha gasta no dia seguinte e, quanto muito, tem para um mês. Não mais do que isso. Significa que a manter-se esta situação por mais do que um mês, a maior parte dessas empresas estará com a corda na garganta. E não podem dizer aos trabalhadores… ‘pagamos quando recebermos os fundos do Governo’. As pessoas precisam de comer”.
O economista tem poucas dúvidas acerca do que pode vir aí. “Se as empresas fecharem vai haver uma crise com alguma gravidade. E não são as três mil patacas em vales eletrónicos que vão ajudar as pessoas a resolver os problemas. Embora essa possa ser a única medida que venha a funcionar no imediato, apesar de se desconhecer ainda como”.
Em paralelo à atribuição de um subsídio a fundo perdido, Albano Martins entende que “o Governo deveria encontrar através da Assembleia Legislativa uma forma de intervir no mercado imobiliário nesta fase”.
“Porquê? Porque as rendas são pesadas demais e numa situação de emergência isso precisa de ser reconsiderado. Seria também mais uma forma de dizer que no passado não se quis saber muito da selvajaria do imobiliário em Macau, nomeadamente o arrendamento. E agora está-se a pagar o custo de se ter deixado descontrolar o mercado imobiliário”, justifica.
O especialista classificou ainda como “salutar as modalidades de empréstimo anunciadas pelo Governo, com juros determinados e amortização num período grande”.
Mas, lembra: “O problema é que as empresas ainda estão a pagar o último tufão (Hato). Portanto, até que ponto é que conseguem sobreviver é a questão básica. Daí as justificadas dúvidas de que sejam medidas para o imediato. Porquê? Porque vão levar tempo para serem aprovadas e executadas e, provavelmente nesse espaço de tempo a crise já passou e as empresas já se afundaram”.
“Esse é o problema. O timing da decisão e o respetivo efeito. Acredito que o timing do que foi anunciado não é o ideal para esta situação”, diz.
Albano Martins dá ainda outro exemplo. “Ainda sobre o imposto profissional dei-me ao trabalho de fazer uma tabela que demonstra que as medidas não foram muito bem pensadas. Por exemplo, quem ganhava 17.500 patacas mensais, em 14 salários, vai ter uma redução no final do ano de 414 patacas. Isso são, como se costuma dizer, ‘peanuts’. Já quem auferia 35 mil patacas por mês, vezes 14 meses, vai ter uma redução de 2077 patacas de imposto. É ridículo. Não tem sentido”.
E conclui: “Isto mostra que não se fizeram as contas”.
António Bilrero 21.02.2020