Será bonita a festa, mas este Campeonato Europeu de Futebol que se realiza em território francês estará sob pressão máxima. Principalmente fora de campo. Porque as ameaças terroristas são reais e sente-se que o pior pode acontecer. É melhor todos estarem despertos para essa possibilidade, porque isso torna-nos mais vigilantes.
Quem olhar a capa desta semana da revista alemã “Der Spiegel” vê uma sublime fotografia da capital francesa com a imponente Torre Eiffel ao longe, no centro de um desenho urbano de uma grande cidade. O título faz-se apenas com uma palavra. Paris. Em subtítulo, surge a frase “a beleza invencível”. Esta momentânea tranquilidade é rapidamente posta em desassossego, quando percorremos outras revistas.
Em território francês, “L”Express” coloca em capa o rosto de um membro do Estado Islâmico, recortado pelos olhos. Em cima da fotografia, sobressai o título “As novas ameaças terroristas”. No interior da publicação, vários artigos falam dos riscos de um novo atentado. “A questão não é a de saber se, mas quando e onde”, escreve-se. A revista recorda que, em finais de 2015, contavam-se 2600 sites e contas no Twitter pró-Daech, criados em território francês, somando-se diariamente 40 mil tweets. Mais à frente, entrevista-se o jornalista David Thomson, da Radio France Internationale, que falou com 30 franceses que regressaram da Síria. A quase totalidade diz não ter abandonado a ideologia do Estado Islâmico. Um deles confessou mesmo que o dia dos atentados à Redação do “Charlie Hebdo” foi o mais feliz da sua vida. Para acentuar o receio que a leitura desta edição vai avolumando, publica-se ainda um texto que aborda as insuficiências que o hexágono evidencia em matéria de políticas de informação. Critica-se a falta de visão estratégica do Ministério do Interior e censuram-se as limitações dos Serviços Secretos. É verdade que o Governo já providenciou 90 mil agentes para vigiar este Euro 2016. Mas os estádios e as zonas circundantes não são o maior problema. A grande tensão estará nos espaços ao ar livre onde se juntarão muitas pessoas para ver os jogos. São esses imprevisíveis lugares que estão a gerar mais preocupação.
O policiamento não pode chegar a todo o lado. Até porque, por estes dias, se vive no país “uma primavera francesa”, como anunciava ontem o “Courrier International”. Governo e sindicatos medem forças por causa de uma polémica Lei do Trabalho que Hollande e Valls insistem em concretizar, ignorando um elementar postulado político que impõe recato nas reformas polémicas em finais de mandato. Os franceses, incitados por musculados sindicatos, nomeadamente pela CGT, têm feito sucessivas greves e incendiado as ruas franceses (até mesmo no sentido literal). E promete-se não ceder a tréguas. Nem para ver a bola rolar nos relvados. E isso pode ser perigoso. Porque pode descontrolar o país, nomeadamente a sua segurança.
Será inesperado o desfecho político deste pesado dossier da Lei do Trabalho. Em qualquer circunstância, será difícil não provocar consequências para o futuro político do atual presidente da República que ambiciona renovar o seu lugar do Eliseu em 2017 e para o seu primeiro-ministro, o catalão Manuel Valls que, subitamente, se viu confrontado com Philippe Martinez, o secretário-geral da Confederação Geral de Trabalhares, também de origem espanhola. Segundo o jornal “The New York Times”, não seria de admirar que um Governo de Direita fizesse passar leis sem o apoio dos sindicatos. O que espanta, acrescenta-se, é estarmos perante um Governo de Esquerda que os sindicatos patrocinaram.
Hollande não é conhecido por ser um bom negociador; Valls extremou de tal forma a sua posição que se torna difícil reverter decisões. Contudo, importa ter em conta que há um Campeonato Europeu de Futebol para disputar e que a rua francesa não pode continuar com tantos tumultos. Ter um país de pernas para o ar não é a solução, mesmo que isso custe a cabeça de alguém. E se falarmos em demissões, a questão não é a de saber se, mas quando. Porque Hollande ou Valls dificilmente conseguirão sobreviver a esta reforma. Pelo menos, que se salve o Euro 2016.
Felisbela Lopes