O presidente da Assembleia Legislativa quer reforçar o papel fiscalizador do órgão e mostrou-se reticente sobre a criação do fundo soberano sugerida pelo FMI
O presidente da Assembleia Legislativa de Macau (AL), Ho Iat Seng defendeu est semana um aperfeiçoamento do papel de fiscalizador do órgão, dizendo que se de uma exigência cada vez maior da população.
“A população está a exigir mais fiscalização, e a Assembleia Legislativa também tem de enfrentar a população. Esperamos colaborar com o Governo”, afirmou. Ho Iat Seng acrescentou que sempre que são detetados problemas ao nível jurídico devem ser apresentadas sugestões ao Governo, e que esses mesmos relatórios e pareceres sobre o processo legislativo devem ser considerados individualmente pelo Executivo.
“O meu desejo é que sejam apresentadas melhorias ao Governo e que este dê a devida atenção ao conteúdo dos relatórios feitos, senão o trabalho de fiscalização não passa de um trabalho artificial”, disse.
Para Ho Iat Seng, “a produção de leis pelos próprios serviços competentes é viável, porque só os próprios serviços compreendem as suas necessidades, mas falta um mecanismo de coordenação legislativa”.
O presidente da AL considerou ainda que na passada sessão legislativa “verificou-se um certo desperdício de tempo”, e disse esperar “que o Governo possa corrigir essa questão”, ao referir que há leis já poderiam ter sido aprovadas na especialidade, mas que não o foram porque o Executivo não entregou as versões finais das propostas atempadamente.
Por outro lado, reconheceu que a AL “retirou ensinamentos” com a polémica proposta de lei intitulada “Regime de garantia dos titulares do cargo de chefe do Executivo e dos principais cargos a aguardar posse, em efetividade e após cessações de funções”.
“Quando estão em causa grandes interesses, a AL tem de ter prudência sobre o ‘feedback’ e a reação da população”, afirmou a propósito da proposta de lei aprovada na generalidade em dezembro, e retirada por iniciativa do governo, a 29 de maio, na sequência do maior protesto da população em Macau desde a transição da administração portuguesa, em 1999.
Na sessão legislativa 2013/2014 foram apenas submetidos seis projetos de lei, todos apresentados pelo deputado José Pereira Coutinho, a título individual, ou com o colega de bancada, Leong Veng Chai, e todos chumbados.
Questionado sobre a iniciativa dos deputados, Ho Iat Seng reconheceu que o número de projetos de lei apresentados “não é suficiente”, mas que compete aos parlamentares avaliarem as suas iniciativas legislativas e procurarem debater os temas e recolher o apoio dos seus pares.
Acrescentou que “a AL tem as suas limitações, mas que “não pode recusar ou escolher as propostas de lei submetidas pelo Governo à AL. “Quanto o Governo entende que é preciso legislar, de acordo com a Lei Básica (mini-constituição do território) temos de aceitar. Mas vamos, passo a passo, recuperar e conquistar a confiança da população”, concluiu.
Durante o primeiro ano da V legislatura, que terminou a 15 de agosto, foram admitidas 16 propostas de lei, das quais nove foram aprovadas, uma foi retirada por iniciativa governamental, e seis transitam para a próxima sessão legislativa.
Entre as propostas de lei que transitam, estão o Regime jurídico do tratamento de litígios decorrentes do erro médico, o Salário mínimo para os trabalhadores de limpeza e de segurança na área de administração de propriedades, e o Regime de prevenção e repressão dos atos de corrupção no comércio externo.
DÚVIDAS SOBRE
O FUNDO SOBERANO
Ho Iat Seng defendeu, por outro lado, que a criação de um fundo soberano, sugerida pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), “deve ser estudada com prudência”.
No primeiro relatório do FMI sobre a economia de Macau, divulgado em julho, a entidade financeira aconselha o território a criar um fundo soberano para investir as reservas fiscais, de forma a acautelar possíveis mudanças económicas, eventualmente derivadas do envelhecimento da população, queda das receitas do jogo e repercussões de reformas na China.
O valor total dos ativos da reserva financeira era, no final de junho, de cerca de 242,03 mil milhões de patacas (22,8 mil milhões de euros), dos quais cerca de 116,46 mil milhões de patacas (10,9 mil milhões de euros) foram destinados à reserva básica e 125,2 mil milhões de patacas (11,8 mil milhões de euros) à reserva extraordinária. Os lucros do investimento ascenderam a 370 milhões de patacas (34,9 milhões de euros).
“Preocupo-me sempre com o retorno dos investimentos. O retorno [dos investimentos] da reserva financeira é relativamente baixo. E no programa eleitoral do candidato à reeleição para o cargo do chefe do Executivo também se fala da criação de um fundo soberano, mas essa é uma matéria que deve ser estudada com prudência”, afirmou o presidente da AL, no balanço do primeiro ano da V legislatura. Ho Iat Seng considerou, por outro lado, o valor dos ativos do governo de Macau “baixo”.
“Um banco de renome em Portugal sofreu um grande impacto e a crise na Europa continua”, observou, aludindo à crise no BES e à instabilidade financeira no velho continente.
Para o presidente da AL, é preciso acautelar riscos: “Claro que o governo pode lançar esses planos, mas corre riscos. Ao mesmo tempo, uma taxa de retorno pouco acima dos 0% também não é aceitável. Perante oscilações, mais vale optar por planos mais seguros e negociar com bancos para conseguir taxas de juros estáveis com capitais garantidos. Não estou contra [a criação de um fundo soberano], mas há que ter prudência”.
No cargo de presidente da AL há um ano, Ho Iat Seng manifestou o desejo de ver concluída na atual legislatura uma lei geral do orçamento. “Não quero uma lei de bases ou de enquadramento, quero uma lei completa. Este ano a despesa pública é grande e sem uma lei do orçamento é difícil [fiscalizar]”, declarou, ao referir que o hemiciclo tem um grupo de trabalho e que ele próprio encetou contactos nesse sentido com o governo.