Virgínia Trigo, coordenadora de doutoramentos em gestão, em Chengdu e Cantão, disse em recente entrevista a este jornal que Macau não tem liderança forte. Há recursos financeiros, históricos, linguísticos e culturais mais que suficientes para diversificar a economia e internacionalizá-la – pela via lusófona. O que não há, conclui a académica, é capacidade de os organizar. Ben Lee, analista de jogo, explica nesta edição que a RAEM não tem massa crítica para inverter a queda das receitas, entregando a Pequim o ónus da solução. Os casinos, habituados a encher os cofres, só por existirem, estão sem reação; os empresários, viciados numa economia rentista, assustam-se com o bolo estatal a minguar; os cidadãos em geral querem rendimento máximo garantido, sem cultura de exigência nem meritocracia. A árvore das patacas perde fôlego e graça, mas também o sossego.
A visão estratégica, o charme, a autoridade, a força e a vontade de conduzir o destino… são cruciais em qualquer cultura: do Japão ao Brasil, passando pela França ou por Angola. Mas na cultura chinesa, ainda mais em regime de partido único, a questão é ainda mais premente. E quando a terra é pequena… só há um tigre na montanha a quem cabe fazer o que lhe compete por lei e dele esperam a cultura e a circunstância.
Chui Sai On tem o mérito que tem. Foi escolhido e está no papel que lhe cabe. Mas tem um perfil apagado, próprio de circunstâncias diferentes. Além disso, o chefe do Executivo tem os dias formalmente contados; sai no fim deste mandato e já não é dele que depende o futuro. Esse espera agora por quem saiba tomar conta disto; como espera também que a China assuma o que quer, o que pensa e aquilo que projeta para lá de 2020; para muitos, a verdadeira data da transição. Porque é aí que se aponta e revela a verdadeiramente visão chinesa do Segundo Sistema, este ensaio híbrido, único no mundo, no qual Deng Xiaoping depositou a esperança inaudita de ser laboratório para a evolução da própria China.
A discussão é agora, nada tem de prematura. Aliás, ela está no coração do poder e flui nos corredores do Palácio. O segredo mais mal escondido deste mundo pequeno, com um destino tão grande, é que já tudo depende do próximo chefe do Executivo e de quem com ele dividir o futuro, na pele de líder o Gabinete de Ligação do Governo Central da China.
Paulo Rego