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A remar para a recuperação

Guilherme RegoGuilherme Rego

Os feriados do Festival dos Barcos-Dragão trouxeram uma nova energia a Macau, com um número acima da média de turistas a lembrar os pequenos negócios de tempos mais prósperos. Claro está… os pedidos de abertura mantêm-se. Mas desta vez parece que foram ouvidos. A redução do período de quarentena está a ser estudada e pode avançar já nas férias de Verão, avançou o Chefe do Executivo. Porém, nada disto evitará uma revisão em baixa do Orçamento de 2022, atesta Ho Iat Seng. A recuperação económica está lenta e o desemprego pode proliferar, sobretudo se se vier a confirmar o encerramento de vários casinos-satélite. O Executivo apazigua quem já não vê o futuro desses estabelecimentos, mas há quem garanta não haver volta a dar e preveja despedimentos em massa para breve

Cerca de 33 mil turistas entraram em Macau na sexta-feira passada (3 de junho), no âmbito do Festival dos Barcos-Dragão. O número, ligeiramente maior do que tem sido a normalidade da RAEM – média diária de 23 mil visitantes, entre abril de 2021 a abril de 2022 – só foi possível atingir graças ao alívio das restrições fronteiriças para visitantes oriundos da província chinesa de Guangdong. Desde 2 de junho que o prazo de validade do teste de ácido nucleico passou de 72 horas para sete dias, permitindo maior flexibilidade no planeamento das viagens.

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Os números francamente animadores no primeiro dia de feriado, porém, não se mantiveram nos dias seguintes. Entre 2 a 5 de junho, apenas 70 mil turistas visitaram Macau, de acordo com os dados preliminares do Corpo de Polícia de Segurança Pública. Significa isso que a média diária registada na sexta-feira desceu no sábado e no domingo (cerca de 17.500 visitantes por dia). Apesar disso, representantes do setor do turismo e das pequenas e médias empresas (PME) vêm o relaxamento fronteiriço como um “passo importante” para a recuperação económica.

Andy Wu, presidente da Associação de Indústria Turística de Macau, garante que caso a situação epidémica se mantenha estável, Macau poderá registar entre 20 a 30 mil turistas por dia em julho; número pode subir no resto do Verão. Ao jornal Tribuna de Macau, Wu disse ainda que os números teriam sido melhores não fosse o “Gaokao”. Segundo aquele responsável, o exame nacional da China para ingresso no ensino superior condicionou muitos dos possíveis visitantes.

Mesmo assim, mostra-se convicto de que melhores dias virão num futuro próximo. Certo é que estes dias permitiram às PME um crescimento notável no volume de negócios, ultrapassando as previsões. De acordo com Lei Cheok Kuan, presidente da Federação da Indústria e Comércio de Macau Centro e Sul Distritos, algumas das PME viram um aumento de 40 a 50 por cento em termos homólogos. Contudo, ressalva, “seria melhor uma retoma total” com o Continente, bem como a “recuperação das deslocações entre as RAE”.

Se, por um lado, os negócios melhoraram com as festividades, a verdade é que também evidenciaram um dos grandes problemas com que Macau se depara no momento: falta de mão de obra. Lei Cheok Kuan explica que as PME têm enfrentado esta dificuldade muito por causa dos entraves colocados à contratação por parte da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL). “Têm cortado completamente as quotas dos trabalhadores não residentes (TNR) sem tratamentos diferenciados”. Os trabalhadores locais seriam a solução, não fosse membros da associação terem apontado para problemas na sua contratação.

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“A DSAL exigiu a essas lojas que fizessem entrevistas de emprego cara a cara com residentes, fixando um determinado número de contratação de locais. As lojas que não quiseram contratar estes trabalhadores tiveram de explicar as razões. Nas lojas que aceitaram, muitos residentes acabaram por abandonar o trabalho três dias depois.

No fundo, os residentes não querem assumir esses trabalhos. Os cortes absolutos têm causado um grande impacto. No Festival de Barcos-Dragão viu-se que muitas lojas não tiveram pessoal para lidar com o aumento de turistas”.

O líder associativo lamenta ainda as queixas de alguns membros “sobre a deterioração da qualidade do serviços de parte das lojas” e aconselha a DSAL a visitar os estabelecimentos e inteirar-se da realidade antes de determinar as políticas relativas aos TNR. “Agora têm vindo mais turistas e se as lojas tivessem de fechar as portas permanentemente por causa da falta de recursos humanos, as autoridades incorreriam em falhas administrativas. O Governo deve avaliar sempre as situações mais atualizadas. O ambiente comercial encontra-se muito árduo e o Governo não deve acrescentar ainda mais obstáculos”, defende Lei Cheok Kuan.

Quarentena reduzida no Verão

A esperança projeta-se agora para as férias de Verão. A diretora dos Serviços de Turismo, Helena de Senna Fernandes, aponta que sempre que o prazo de validade do teste ácido nucleico esteve válido por sete dias, o número de visitantes diários oriundos da China Continental fixou-se entre 30 a 40 mil, ultrapassando a atual média.

A aproveitar a onda de alívio de restrições fronteiriças, Senna Fernandes afirmou também que serão lançados incentivos à estadia em Macau, com mais descontos para turistas na marcação de bilhetes de voos e de quartos de hotel.

Também no Verão, segundo anunciou o Chefe do Executivo na segunda-feira, poderá ser implementada uma redução no período de quarentena para quem vem do estrangeiro.

Já em fase de testes no Continente, o modelo pressupõe uma quarentena de 10 dias em hotel, sob observação médica, e sete dias em casa, em autogestão.

“Quatro cidades–piloto no interior da China fizeram a experiência, no mês passado (…), e as autoridades estão a avaliar a situação. Esta parece ser a tendência”, afirmou o governante, à margem da cerimónia de inauguração do Centro de Saúde de Seac Pai Van. Ho Iat Seng admitiu mesmo que não está excluída a hipótese de sete dias de quarentena mais sete de autogestão. Contudo, tudo depende da evolução pandémica. Caso haja novos surtos, “nem se fala de 14 dias”, com a quarentena a poder voltar aos 21 dias.

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Em dezembro de 2020, Macau adotou um período de observação médica de 21 dias para os residentes que vinham do estrangeiro. Esse período foi reduzido em março para 14 dias mais sete em casa. A expectativa do Executivo é que o modelo “10+7” possa vir a substituir o anterior, continuando a adotar uma política de relaxamento gradual das fronteiras, sempre que a situação pandémica assim o permitir.

Sem novidades permanece a retoma com Hong Kong; com o líder do Governo a remeter essa responsabilidade para as autoridades de saúde e segurança. A Região Administrativa Especial vizinha foi o segundo mercado de visitantes com mais peso em Macau nos últimos 12 anos (22 por cento). Com a queda dos promotores de jogo e aperto de Pequim à indústria de fortuna ou azar, alguns analistas vêm Hong Kong como possível solução para colmatar parte do fosso da receita bruta da atividade.

Questionado sobre o facto de as autoridades do interior da China estarem a ser mais rigorosas na emissão de vistos individuais para Macau, Ho Iat Seng reconheceu que isso está a colocar pressão à recuperação económica de Macau. Contudo, acredita que a emissão de vistos vai normalizar quando a situação da pandemia for mais estável.

Impacto orçamental e desemprego

Os entraves ao normal funcionamento da atividade de jogo forçam nova revisão do Orçamento. Tendo em conta o impacto negativo da situação pandémica na China Continental, Ho Iat Seng admitiu que a Lei do Orçamento de 2022 terá de ser revista em baixa, prevendo a sua apresentação à Assembleia Legislativa no segundo semestre do ano. As receitas de jogo do mês passado caíram 68 por cento face ao período homólogo de 2021, segundo dados divulgados recentemente pela Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ). Já as receitas nos primeiros cinco meses do ano diminuíram 44 por cento em termos anuais.

Ho Iat Seng aproveitou também para se referir à situação dos casinos-satélite, defendendo que, pelo que sabe, a maioria destes casinos vão continuar a operar, apesar de não ter à sua disposição números concretos: “A situação de desemprego de Macau não será agravada porque há muitos casinos-satélite que vão continuar a funcionar, pelo que os trabalhadores não se devem preocupar”.

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Opinião diferente tem o presidente da Associação de Mediadores de Jogos e Entretenimento de Macau, Kwok Chi Chung, tendo confirmado ao jornal Exmoo que até ao final de junho vão encerrar entre seis a oito casinos-satélite.

Apesar de não avançar quais, por “não ser conveniente”, diz que os encerramentos são motivados pela descrença generalizada quanto ao futuro do setor, mesmo depois de o Governo ter recuado na intenção de obrigar a que os imóveis onde os casinos-satélite operam sejam propriedade das concessionárias, no âmbito da Lei do Jogo.

Segundo o presidente da associação, a falta de clientes não permite a estes espaços margem de lucro. Face a este cenário, o dirigente avisa que os despedimentos em massa vão ser uma realidade e que pelo menos um dos casinos deverá despedir entre 200 a 300 pessoas. Kwok considera que os setores onde o Governo pretende apostar para alavancar a diversificação económica não serão capazes de absorver este pessoal, adensando o problema do emprego.

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