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Pandemia, Hengqin e junkets: o que esperar de Macau em 2022

Meimei Wong e Leonel GuerraMeimei Wong e Leonel Guerra

A recuperação económica de Macau em 2021 foi enfraquecida pela pandemia da Covid-19. No próximo ano, essa variável permanece, bem como surge uma nova: o declínio do setor junket. Ao PLATAFORMA, especialistas revelam os maiores receios quanto ao futuro de Macau, evidenciando que as previsões do Governo para 2022 se alicerçam num cenário otimista – livre de vírus e de gradual abertura da cidade. Sobre as incertezas que pairam na indústria do jogo, salientam que Hengqin não terá capacidade para substituir o seu peso económico nos próximos anos. 

O Orçamento do Governo da RAEM para o ano de 2022, aprovado pela Assembleia Legislativa, prevê que a situação económica da cidade continue austera e de recuperação lenta. Estima-se que receita bruta do jogo ronde os 130 mil milhões de patacas – tal como em 2021, onde a Lei do Orçamento sofreu três alterações, retirando da reserva financeira um valor acumulado de 44,3 mil milhões de patacas. 

O duplo impacto da pandemia e redução drástica do número de promotores de jogo leva Ron Lam a afirmar que a previsão do Governo relativamente às receitas geradas pela indústria do jogo é excessivamente otimista. “Parece-me que este valor não será atingido, a não ser que Macau se veja livre do vírus no próximo ano. Contudo, acredito que nos próximos três a cinco anos possamos atingi-lo”, revela ao PLATAFORMA.  

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Quem partilha da mesma opinião é Ricardo Siu, professor associado da Faculdade de Gestão de Empresas na Universidade de Macau. Desde que a situação pandémica esteja estabilizada, defende que será possível chegar às 130 mil milhões de patacas oriundas das receitas de jogo. O mesmo vinca que a pandemia é o principal obstáculo e que as estimativas do Governo assumem um cenário com a situação epidémica sob controlo, salientando também a importância da abertura para Hong Kong de forma a recuperar parte da receita VIP. “Analisando a receita de mais de 290 mil milhões em 2019, os clientes de Hong Kong contribuem acima de 20 por cento para a receita bruta de jogo de Macau, cerca de 60 mil milhões de patacas”, refere.  

Com a influência da pandemia, o académico acredita que a receita deste ano deve esbarrar nos 90 mil milhões de patacas – 28 mil milhões provenientes de salas VIP. E caso Macau e Hong Kong consigam abrir gradualmente durante o próximo ano, os clientes de Hong Kong poderão auxiliar a recuperação da receita VIP: “Não posso dizer que somente os clientes de Hong Kong conseguem trazer a receita de volta aos 60 mil milhões de 2019, mas mesmo que consigam restaurar apenas 30 mil milhões, já estariam a compensar a falta de clientes VIP em 2021”.  

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Sobre a queda dos junkets, Ricardo Siu acredita que o mercado de massas pode colmatar o fosso, desde que a situação epidémica na China Interior estabilize. Tendo como referência os dados da receita de 2019, explica que se apenas contabilizarmos o mercado de massas, sem incluir as salas VIP, a receita de jogo rondou as 157 mil milhões de patacas. Regressando apenas a 80 por cento do que foi atingido em 2019, ou seja, cerca de 126 mil milhões, a estimativa do Governo para o ano de 2022 já assumiria contornos realistas, assume, relembrando que para tal acontecer, não pode haver novos surtos. “Se houver novas epidemias, a estimativa terá de ser ajustada”.  

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Numa entrevista na passada segunda-feira (dia 20), após um jantar de celebração do retorno de Macau à China, Lei  Wai Nong, secretário do SEF (Secretaria para a Economia e Finanças) disse que, considerando o impacto futuro das reduções no número de promotores de jogo em Macau, o Governo irá fazer “ajustes dinâmicos” para atingir os 130 mil milhões de patacas previstos para o próximo ano.   

Caso  Suncity   

Depois da detenção de Alvin Chau, único acionista da maior promotora de jogos em Macau, o Suncity Group, suspeita-se que as operadoras de jogo irão fechar as salas VIP geridas por promotores de jogo. Lei Wai Nong explicou que o Governo continuará a “aceitar e apreciar todos os pedidos” que reúnam as condições necessárias, apesar das alterações terem afetado a relação entre promotores e operadores.  

Linda Chen, vice-presidente do Conselho de Administração do Wynn Macau, confirmou à imprensa que a cooperação entre o Wynn e os promotores de jogo iria chegar ao fim ainda em 2021. Uma decisão que a própria define como “benéfica para o desenvolvimento saudável de Macau”. A mesma reitera que não está receosa com uma possível redução na sua receita, e que está confiante de que o negócio melhorará desde que a situação epidémica estabilize e sejam criadas mais atividades “turismo+” para atrair um grupo de turistas mais diversificado.   

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Lam Kai Kong, membro da indústria, caracteriza a atual situação como um “tratamento intensivo” aos promotores de jogo. Ao PLATAFORMA, indica que ainda há vários fatores do caso Suncity por revelar, fazendo com que grande parte da indústria receie sofrer o mesmo tipo de ação legal. É um “medo impossível de combater”, descreve. “A indústria não sabe quando está a pisar a linha vermelha, ou se já a pisaram. Mesmo com todo o cuidado do mundo, não existe qualquer garantia. A capacidade do Governo de rastrear ações passadas é ilimitada”, defende. Por essa razão, sublinha a importância da definição de limites claros pelo Governo, com normas explicitas para o setor junket seguir. 

O membro da indústria receia ainda que o caso Suncity gere novo desastre económico: “O maior impacto [do caso Suncity] está no facto de cerca de 7 a 8 mil pessoas estarem agora desempregadas, ou seja, cerca de 7 a 8 mil famílias afetadas. A perda repentina do poder de consumo de uma parte da população, numa microeconomia como a de Macau, pode causar uma diminuição na procura e consumo local”.  

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Lam Kai Kong cita ainda o exemplo de vários jovens na indústria com possíveis empréstimos e que se encontram agora no desemprego. Podem acabar por ser obrigados a fazer cortes nos pagamentos, ou forçados a vender propriedades a baixo valor, criando uma pressão adicional no mercado imobiliário da cidade e na sociedade de Macau, em termos económicos.   

Hengqin ainda não tem força 

Ron Lam critica o Governo por não mencionar quaisquer operações contracíclicas, sem aumentos no investimento da economia e infraestruturas sociais. “Com mais de 600 mil milhões de patacas em reservas, o Governo não implementou operações contracíclicas, uma medida bastante negativa. No que diz respeito a medidas económicas a curto prazo, não parece estar a fazer nada”, critica. 

Com a Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin ainda numa fase inicial, o deputado assegura que ainda é necessário um longo período de tempo até reunir os recursos e as regulamentações necessárias para apoiar o seu desenvolvimento, sendo que a sua contribuição para a economia de Macau, a curto prazo, será reduzida. “Nos próximos três a cinco anos, não podemos esperar que a Zona de Cooperação tenha uma contribuição significativa”, enfatiza. 

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O discurso de diversificação tem sido promulgado pelo Governo local e central. Albano Martins, economista, chega mesmo a lançar a ideia de que Pequim pretende afundar a indústria do jogo em Macau. 

Contudo, a prometida regeneração económica em Hengqin ainda vai demorar, ressalva o economista José de Sales Marques à Lusa. As autoridades afirmam que o projeto é essencial para combater a dependência da indústria do jogo, que atualmente representa 55,5 por cento do PIB e 80 por cento das receitas do Território, e prometem apostar no desenvolvimento de indústrias em áreas como saúde, financeira, tecnologia de ponta e turismo. Mas isso “leva algum tempo para ganhar suficiente dimensão, para crescer”, reitera. 

Ricardo Siu concorda e vai ainda mais longe: “O desenvolvimento da Zona de Cooperação está em curso, mas não há como negar que é ligeiramente irrealista que a receita gerada em Hengqin se torne numa fonte essencial de rendimento ou em algo capaz de igualar a indústria do jogo em apenas cinco ou 10 anos”.  

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Questionado sobre a possibilidade do declínio no número de promotores de jogo acelerar o desenvolvimento da diversificação económica de Macau em Hengqin, o professor acredita que existe uma correlação. “Provando que a regulamentação de salões de jogo não é assim tão eficaz, no futuro, mesmo que um promotor de jogo consiga transformar-se com sucesso, poderá receber uma fiscalização ainda mais apertada. O negócio das salas VIP será mais transparente em termos de trocas de capitais, profissionais e histórico dos jogadores. Esta situação irá promover o desenvolvimento de áreas não relacionadas com o jogo, que consequentemente irão deixar um impacto positivo na indústria financeira moderna, entre outras, em Macau e Hengqin”, explica.    

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