O apoio das autoridades da União Europeia (UE) à França na crise dos submarinos deixou ainda mais tensa a relação do bloco com os Estados Unidos, apesar de o presidente Joe Biden ter anunciado nesta segunda-feira a flexibilização das restrições de viagens aos europeus
A tensão gerada pela aliança entre Estados Unidos, Reino Unido e Austrália agitou o ambiente dos encontros que antecedem a abertura da Assembleia Geral da ONU, prevista para esta terça-feira.
Biden, que irá discursar amanhã na reunião multilateral, pretende acelerar a luta contra a pandemia e as mudanças climáticas e alcançar uma posição comum sobre o Afeganistão, onde os talibãs voltaram ao poder após duas décadas de presença americana. Mas a crise com a França ofuscou a atividade diplomática do fórum.
O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, acusou hoje os Estados Unidos de falta de lealdade, depois que a Austrália cancelou um amplo contrato com a França para comprar submarinos de propulsão nuclear americanos.
“Os princípios mais elementares para os aliados são transparência e confiança e estas andam juntas. Estamos vendo uma clara falta de transparência e lealdade”, disse Michel à imprensa nas Nações Unidas, antes da Assembleia Geral da ONU, em Nova York. Os europeus, disse, precisam “esclarecer e tentar compreender quais são as intenções que estão por trás deste anúncio”.
Michel assegurou que este acordo entre os Estados Unidos, o Reino Unido e a Austrália impulsionará os esforços europeus para construir seu próprio sistema de defesa. Uma decisão assim “não irá contra nossos aliados, mas se somos mais fortes e mais robustos, significa que nossas alianças também serão mais fortes”, acrescentou.
Michel demonstrou certa decepção com Joe Biden, que assumiu a Presidência americana defendendo o reforço das alianças após o período divisivo de seu antecessor, Donald Trump.
Com Trump, “pelo menos estava claro – o tom, a substância, a linguagem – estava muito claro que a União Europeia não era, na sua opinião, um aliado útil”, disse Michel.
Também nesta segunda, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse à CNN que o tratamento reservado à França pela Austrália no contexto da aliança com os Estados Unidos e o Reino Unido, é “inaceitável” e que o caso requer uma análise profunda.
“Um dos nossos Estados-membros foi tratado de forma inaceitável. Queremos saber o que aconteceu e porque”, disse Von der Leyen, em alusão ao cancelamento do contrato bilionário entre a França e a Austrália.
A Austrália disse compreender a decepção da França, mas que seus submarinos convencionais seriam insuficientes para manter a defesa do país nas próximas décadas em meio às tensões crescentes com a China.
A França se sentiu traída por esta aliança. O ministro francês das Relações Exteriores, Jean-Yves Le Drian, acusou a Austrália de dar uma “punhalada nas costas” e os Estados Unidos de traição.
A chanceler belga, Sophie Wilmes, que também está nas Nações Unidas para participar da Assembleia Geral, descreveu o acordo com uma “bomba, primeiro para a França, mas também para a Europa e para o mundo em nível geoestratégico”. A Europa precisa ter mais voz e ser mais “presente no cenário internacional”, disse.
A ministra manifestou esperança em que haja uma base comum de entendimento entre os chanceleres europeus que estão em Nova York, embora alguns diplomatas tenham assegurado que a França não está buscando um comunicado formal de apoio.
Em um gesto significativo, o governo Biden anunciou que irá levantar as restrições aos viajantes estrangeiros, desde que os mesmos estejam vacinados e se submetam a um teste de Covid. A UE, que precisa da retomada do turismo, relaxou as restrições há meses, mas ameaçou reintroduzi-las caso não houvesse reciprocidade por parte dos Estados Unidos.