A segunda vice-presidente do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), Odete Semedo, afirmou hoje que assistiu-se hoje no parlamento à consumação do golpe de Estado, iniciado em 27 de fevereiro.
Odete Semedo discursava na sede do PAIGC para assinalar a ausência do partido na sessão parlamentar, hoje iniciada, em que uma maioria de deputados começou a discussão do programa do Governo, do primeiro-ministro Nuno Nabian.
“Estamos a assistir hoje à consolidação, consumação do golpe de Estado, no parlamento, que acreditávamos, que por ser a casa da democracia, ia dizer não à ilegalidade”, defendeu Odete Semedo.
Oficialmente, o PAIGC não autorizou a presença dos seus 47 deputados na sessão parlamentar, mas cinco marcaram presença no hemiciclo e proporcionaram uma maioria que se posicionou do lado do Governo de Nuno Gomes Nabian.
Odete Semedo disse que a Guiné-Bissau assiste a um “autêntico terrorismo de Estado”, em que deputados são perseguidos e dirigentes políticos presos pela polícia.
“Não podemos misturarmo-nos com o eixo do mal que nos quer prender no nosso país”, observou Semedo.
A dirigente do PAIGC afirmou que tem sido alvo de ameaças, por parte de desconhecidos, através de mensagens de telemóvel em que é apontada “como a próxima vítima”.
“Disse a essa pessoa para vir pessoalmente e sem armas”, acrescentou Odete Semedo.
O líder da bancada parlamentar do PAIGC, Califa Seidi, considerou que o seu partido “está determinado a pôr fim às manobras antidemocráticas” na Guiné-Bissau e ainda criticou o posicionamento do atual primeiro-ministro.
“[Nuno Nabian] está a tentar roubar o poder conquistado pelo PAIGC nas urnas, quando no passado o próprio se posicionou contra isso quando era Presidente José Mário Vaz”, defendeu Califa Seidi.
O líder do grupo parlamentar da Assembleia do Povo Unido-Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB), Marciano Indi, lamentou ser “uma pena que a democracia esteja a regredir” no país, mas frisou que os deputados do seu partido não permitirão que isso vingue.
“A nossa palavra nunca cairá no chão. Nunca vamos colocar em causa as regras democráticas”, afirmou Indi, avisando aqueles que “hoje têm o poder da força” que a história registará a contribuição de cada um no processo democrático.
Quatro deputados do PAIGC votaram hoje a favor da introdução na ordem do dia do parlamento da Guiné-Bissau da discussão do programa do Governo liderado por Nuno Nabian.
A comissão permanente do PAIGC tinha dado indicações para os 47 deputados do partido, eleitos nas legislativas de março de 2019, não participarem na sessão plenária, que entre vários assuntos, pretende definir quem tem a maioria no parlamento.
Hoje compareceram na sessão plenária cinco deputados do PAIGC, incluindo o Presidente do parlamento, Cipriano Cassamá, que se absteve de participar na votação.
A apresentação, discussão e votação do programa de Governo foi aprovada com o voto de 54 deputados, num universo de 102 deputados, nomeadamente quatro do PAIGC, um do Partido da Nova Democracia, um da APU-PDGB, 27 do Movimento para a Alternância Democrática (Madem-G15), e 21 do Partido de Renovação Social (PRS).
Quatro dos cinco deputados da APU-PDGB estiveram ausentes, assim como o deputado da União para a Mudança e os restantes 42 deputados do PAIGC.
A Guiné-Bissau está a viver um período de especial tensão política com o parlamento guineense dividido em dois blocos com ambos a reivindicarem a maioria parlamentar e a defenderem o seu direito de formar Governo.
A Guiné-Bissau tem vivido desde o início do ano mais um período de crise política, depois de Sissoco Embaló, dado como vencedor das eleições pela Comissão Nacional de Eleições, se ter autoproclamado Presidente, em fevereiro, apesar de decorrer no Supremo Tribunal de Justiça um recurso de contencioso eleitoral apresentado pela candidatura de Domingos Simões Pereira.
Na sequência da sua tomada de posse, o Presidente guineense demitiu o Governo do PAIGC, liderado por Aristides Gomes, e nomeou para o cargo Nuno Nabian, líder da APU-PDGB.
No âmbito da mediação da crise política na Guiné-Bissau, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) reconheceu, em abril, Umaro Sissoco Embaló como Presidente e instou à nomeação de um novo Governo, que respeite os resultados das legislativas de 2019, num prazo que terminou em 22 de maio.
A crise política agudizou-se depois de não ter havido entendimento para formar um Governo, até 22 de maio, que respeitasse os resultados das eleições legislativas de 2019, ganhas pelo PAIGC.
O prazo dado pela CEDEAO não foi respeitado, nem o de 18 de junho dado pelo chefe de Estado guineense.
Umaro Sissoco Embaló, que admitiu dissolver o parlamento caso não houvesse entendimento entre as várias fações políticas, disse agora que vai esperar pela sessão plenária de hoje, onde será determinado quem tem a maioria parlamentar.
O PAIGC venceu as legislativas sem maioria e fez um acordo de incidência parlamentar com a APU-PDGB, Partido da Nova Democracia e União para a Mudança, obtendo 54 dos 102 assentos no parlamento.
Logo no início da legislatura, o líder da APU-PDGB, Nuno Nabian, incompatibilizou-se com o PAIGC e aliou-se ao Madem-G15, segunda força política do país e o PRS.
Apesar da nova aliança, quatro dos cinco deputados eleitos pela APU-PDGB mantiveram a sua lealdade ao acordo de incidência parlamentar assinado com o PAIGC.
A sessão plenária prossegue com a apresentação, discussão e votação do programa de Governo de Nuno Nabian.