Início » Impacto da covid-19 na diplomacia

Impacto da covid-19 na diplomacia

João Pimenta

Um relatório da Anbound, instituição chinesa especializada em relações internacionais, adverte que a pandemia do novo coronavírus “ameaça deteriorar” as relações geopolíticas da China e defende que Pequim deve “melhorar a gestão das diferenças” e “trocar mais informação”.

Fundada em 1993, em Pequim, a Anbound é uma das maiores unidades de investigação da China especializada em geopolítica e relações internacionais, prestando aconselhamento nas áreas de previsão estratégica, soluções políticas e análise de riscos.

“Para melhorar o estado das relações geopolíticas e aliviar alguma pressão, a China precisa de realizar mais trocas de informação, gerir melhor as diferenças e prestar maior apoio prático à comunidade internacional”, afirma o documento a que a agência Lusa teve acesso.

No relatório, a Anbound lembra que é “bastante óbvio” que o relacionamento entre a China e o Ocidente está a deteriorar-se, “sobretudo com os Estados Unidos”.

“A tensão entre a China e os Estados Unidos e muitos países europeus está a aumentar”, nota.

No conjunto, a pandemia do novo coronavírus, que teve origem na cidade de Wuhan, no centro da China, em dezembro passado, já fez mais de 225.000 mortos nos Estados Unidos e Europa, e ameaça causar a maior recessão económica desde a Segunda Guerra Mundial.

A pandemia surgiu numa altura de renovadas tensões entre Pequim e Washington. Desde a chegada de Donald Trump à Casa Branca, os EUA passaram a definir a China como “principal ameaça”, apostando numa estratégia de contenção das ambições chinesas que resultou já numa guerra comercial e tecnológica.

Já a Europa tem tentado um equilíbrio nas relações com Pequim, que considera simultaneamente um “rival” que “promove modelos alternativos de governação”, um “concorrente económico na corrida da liderança tecnológica”, mas também um “parceiro” em áreas como as alterações climáticas ou o multilateralismo.

A União Europeia (UE) e a China tinham preparadas duas cimeiras para este ano, visando desenvolver uma nova parceria estratégia, mas a pandemia parece estar a complicar a relação, com vários líderes europeus a expressarem publicamente insatisfação para com Pequim.

Em causa está, por exemplo, a discrepância entre a taxa de letalidade do vírus, a qual se revelou ser mais do dobro em vários países europeus do que sugeriam os números apresentados pela China.

O regime chinês, nunca recetivo a críticas externas e temendo os danos sobre o controlo doméstico, tem respondido agressivamente, combinando campanhas de assistência médica com uma retórica nacionalista, enquanto exige demonstrações de gratidão e faz ameaças económicas.

PASSOS EM FALSO
“A China foi excessivamente agressiva”, concorda o eurodeputado ecologista Reinhard Bütikofer
. “Se tivesse atuado modestamente, poderia ter sido bem recebida (…), ao invés, difundiu mentiras sobre a origem do vírus e vangloriou-se excessivamente sobre o fornecimento de equipamento médico que, em alguns casos, se revelou defeituoso”, diz.

O resultado tem sido uma crescente desconfiança sobre a China na Europa, que já se vinha a intensificar nos últimos anos.

A Suécia, por exemplo, que foi o primeiro país ocidental a estabelecer relações diplomáticas com a República Popular da China, em 1950, ordenou o encerramento do último Instituto Confúcio no país a semana passada, na sequência de disputas diplomáticas com Pequim à volta do caso de Gui Minhai, um editor e livreiro sueco de origem chinesa, de 54 anos, que vendia obras críticas do regime chinês em Hong Kong e foi condenado a dez anos de prisão na China.

O Instituto Confúcio é um organismo patrocinado por Pequim para assegurar o ensino da língua e cultura chinesa, e presente em universidades em todo o mundo, mas é visto como parte da propaganda e atividades de influência do regime chinês.

França, Holanda e Inglaterra foram outros países em que se acentuaram nos últimos tempos as divergências com Pequim, seja por comportamentos considerados inadequados da parte de representações diplomáticas, por situações que envolvam Taiwan ou por anunciarem que vão fazer “perguntas difíceis” às autoridades chinesas sobre as origens do novo coronavírus responsável pela covid-19.

A Alemanha, Reino Unido e outros países europeus juntaram-se também já à Austrália e aos Estados Unidos no apelo para uma investigação independente sobre a origem do novo coronavírus.

Reconhecendo que, “embora a China tenha o direito de recusar qualquer tipo de pedidos para uma investigação”, a Anbound adverte que essa postura “não constitui uma solução viável a longo prazo”.

“Face a questões globais, a China não se pode dar ao luxo de ignorar a perceção de que o mundo tem sobre o país, nem pode recusar-se a cooperar e trocar informações com outros países”, lê-se no relatório.

“Estamos certos de que a negatividade continuará a intensificar-se, o que significa é que, se a China não responder adequadamente, as relações geopolíticas terão um grande impacto no futuro”, adverte.

Contate-nos

Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

Plataforma Studio

Newsletter

Subscreva a Newsletter Plataforma para se manter a par de tudo!