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Combater a pandemia, sem morrer de fome

Luís Miguel Fonseca

O Governo pede para que ninguém saia de casa, por forma a conter a pandemia, mas falta uma “cesta básica” para quem depende dos biscates do dia para comer – que é a maioria das famílias. Parceiros alinham-se para 700 milhões de dólares a Moçambique.

Usando o impacto financeiro como medida, o Governo de Moçambique estima que a pandemia de covid-19 lhe cause um rombo de 700 milhões de dólares (cerca de 5,5 mil milhões de patacas) no Orçamento de Estado deste ano. Foi esse o valor que pediu aos parceiros internacionais, numa reunião realizada no final de março, em Maputo.

“A nossa situação fiscal vai ser severamente afetada pela queda das receitas tributárias, devido ao abrandamento económico e às despesas acrescidas para responder a necessidades críticas na saúde e assistência social para ajudar os mais vulneráveis”, justificou o Executivo três semanas depois, numa carta enviada ao Fundo Monetário Internacional (FMI) a pedir apoio no âmbito da linha de crédito rápido (RCF, sigla inglesa).

A resposta foi positiva: no final do mês, o fundo anunciou que vai emprestar 337 milhões de dólares, cerca de metade do valor pedido, no que se espera seja uma medida “catalisadora” para outros parceiros. São 309 milhões de dólares através da RCF e 28 milhões de dólares numa linha para alívio e contenção de catástrofes. A juntar estas somas, já havia outras: todas as prestações de serviço de dívida de Moçambique ao FMI para o período de 14 de abril a 13 de outubro de 2020 foram convertidas para apoio ao Governo no combate à pandemia, num total de 15 milhões de dólares.

O relatório do FMI divulgado no final de abril mostra que o Governo conta ainda compor o Orçamento de Estado com um apoio de 100 milhões de dólares do Banco Mundial e espera que a União Europeia (UE) desbloqueie 54 milhões de dólares. Além da ajuda orçamental, há depois 132 milhões de dólares em apoio a projetos, pelo Banco Mundial, Banco Islâmico de Desenvolvimento e parceiros da iniciativa Pro- Saude. Haverá ainda 77 milhões de dólares de outras fontes. E assim se chega perto dos 700 milhões de dólares.

Haverá neste processo um regresso à modalidade de apoio direto ao Orçamento de Estado, suspenso pelos parceiros em 2016 por causa do escândalo das dívidas ocultas? Não, esclarece a UE. Moçambique deverá receber 110 milhões de euros em dois anos (2020- 2021), mas as modalidades concretas de execução “estão ainda em discussão”. O bloco sublinha que não se trata de um regresso ao apoio direito ao OE, algo que “não está em cima da mesa”. Isto, apesar de admitir que o país vai beneficiar de dinheiro que, na prática, será entregue ao Governo para tapar uma quebra fiscal no orçamento. Do seu lado, o FMI avança que “discussões sobre um novo programa plurianual no âmbito da linha de crédito ampliado (ECF, sigla inglesa) estão planeadas, mas não podem ser concluídas de imediato”.

Para que vão servir os milhões​​​​​​​ ​​​​​​​
Moçambique quer aplicar uma fatia de 40 por cento na cobertura de perdas pela tributação de impostos. Um total de 119 milhões de dólares deverá financiar o setor da Saúde. Depois, 314 milhões de dólares serão direcionados para proteção social: ajuda a pequenas empresas e transferências em dinheiro dirigidas a famílias pobres de maior risco. E é sobre este último grupo que têm recaído as maiores atenções e alertas.

O Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), uma organização não-governamental (ONG) local que acompanha as políticas públicas, considera que o Governo deve “criar uma bolsa família para dar algum poder de compra às famílias moçambicanas que se dedicam a atividades económicas informais”.

Caso contrário, vão continuar a sair à rua todos os dias, violando uma das principais recomendações do estado de emergência (em vigor desde 01 de abril e até final de maio): fiquem em casa.

Apesar de considerar importante haver um apoio do tipo “bolsa família”, Naimo Faquirá, diretor executivo da Associação Moçambicana de Economistas (Amecon), alerta: as restrições orçamentais vão impedir um apoio mais forte às áreas sociais.

Na mesma linha está uma das vozes moçambicanas mais influentes: Lourenço do Rosário, fundador e antigo reitor da Politécnica, a primeira universidade privada em Moçambique. “O Estado tem de encontrar uma vizinhança saudável no limite entre a segurança sanitária e a segurança alimentar para as populações mais desfavorecidas”, defende.

Impacto duro na hotelaria e turismo
Nos primeiros 30 dias do estado de emergência em Moçambique, durante o mês de abril, 1.175 empresas suspenderam atividade, afetando 12.160 postos de trabalho, indicou a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA. Do total de firmas encerradas, cerca de 756 são do sector de hotelaria e turismo e empregam um total de cinco mil trabalhadores. “Adicionalmente, apurou-se que as empresas que ainda se mantêm em funcionamento reduziram o seu nível de atividade para menos de 25%”. O setor empresarial acumula perdas de faturação estimadas em 87 milhões de dólares.

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