Pouco mais de um ano depois de restabelecer relações diplomáticas com Pequim, uma delegação do turismo de São Tomé e Príncipe participou na Expo Internacional de Turismo (Indústria) de Macau. Mirian Barroso Daio, responsável pelo setor neste arquipélago africano plantado no Atlântico, mesmo em cima da linha do Equador, esclarece que o país aposta num turismo seletivo, de natureza, e não nas massas. Mas conta com a experiência de Macau no setor para melhorar a resposta aos desafios que a indústria enfrenta.
– Passou um ano e um mês sobre a adesão ao Fórum Macau? O que vêm mostrar?
Mirian Barroso Daio – Bem, convém esclarecer que a nossa primeira presença aqui, no âmbito da 6.ª Expo Internacional de Turismo (Indústria) de Macau, decorre do memorando de entendimento que a Direção Geral de Turismo e Hotelaria de São Tomé e Príncipe assinou no final de abril com os Serviços de Turismo de Macau.
– Mas esta é a primeira participação no certame?
M.B.D. – Exato. Aproveitámos a nossa presença aqui, para firmarmos esse documento e, coincidindo ele com o momento da feira, resolvemos participar.
– E o que pretendem com esta presença?
M.B.D. – Em primeiro lugar começar a perceber um mercado que, para nós, é totalmente desconhecido. Queremos perceber qual é essa dinâmica, o que é que ele procura. E de que forma São Tomé, a partir daqui, pode captar também algum mercado para si.
Volto ao início da conversa. E o que é que vêm aqui mostrar?
MBD:O que temos para mostrar é todo o nosso potencial no âmbito desta indústria do turismo. São Tomé e Príncipe é um destino, hoje, que se quer afirmar como um destino de natureza. É essa a estratégia que está definida. Claro que também temos muito sol e mar para oferecer.
– O que é isso de um destino de natureza?
M.B.D. – É um destino virado para o turismo de natureza. E esse é, sem dúvida, o grande potencial que o país tem, valorizando, sobretudo, as questões da biodiversidade. E é isso que nos trás aqui. Mostrar também o que temos e somos, uma cultura e uma gastronomia ricas e um povo acolhedor. E temos, acima de tudo, muita segurança para oferecer. Somos um destino bastante seguro para quem nos procura.
– Duas ilhas principais e um ilhéu habitado. Estão preparados para essa aposta?
M.B.D. – Temos bastantes facilidades no acesso dos turistas às nossas ilhas, para que possam desfrutar delas. Sabendo que têm de ser melhoradas, temos, todavia, essas facilidades instaladas.
– Mas o turismo exige, em regra, investimento, designadamente em infraestruturas como aeroportos, portos, estradas, hotéis, hospitais, etc? Essa é também uma prioridade nesta fase de desenvolvimento, procurar investimento chinês?
M.B.D. – Bem, quando falamos de investimento global para o país, neste momento ainda carecemos de algumas infraestruturas básicas que ofereçam melhores condições de acolhimento a quem nos visita. Nessa área está, por exemplo, o aeroporto. É importante ter um aeroporto mais moderno, capaz de receber bem quem nos visita. Temos também o porto. Apesar de ser uma estrutura com uma vertente muito comercial, uma plataforma de serviços para o continente africano, pensamos que em matéria de turismo devemos ter condições para receber navios de cruzeiro, uma vez que pelas nossas águas territoriais passam ao longo do ano muitos navios. Por isso, podemos ser também um ponto de atração para uma paragem.
– A melhoria das infraestruturas enquadra-se, de certo modo, numa prática seguida pela China em matéria de cooperação. Essa vai ser uma das apostas?
M.B.D. – Acreditamos que sim. Isto porque a China tem um padrão, digamos assim, daquilo que tem sido a sua cooperação com muitos outros países, por todo o mundo. A China, como é do conhecimento de todos, tem deixado um legado nesses países em matéria de infraestruturas. O próprio Estado santomense, no passado, já beneficiou dessa cooperação com a China. Por isso contamos com a retoma dessa cooperação para podermos beneficiar na construção de novas infraestruturas para o país. Quero acrescentar que, além dos principais investimentos que o país carece, no âmbito das infraestruturas aeroportuárias e portuárias, há ainda outras áreas prioritárias como sejam infraestruturas no domínio da saúde e da rede de estradas.
– Depois de pouco mais de um ano de reatamento de relações diplomáticas entre São Tomé e Príncipe e a China (26 de dezembro de 2016), e da adesão ao Forúm Macau em março de 2017, como é que o país olha para este lado do mundo, para esta região especial?
M.B.D. – O que esperamos de Macau? Na verdade precisamos de conhecer e perceber melhor o que é o território, o que é que podemos realmente aproveitar, valorizar e levar em termos de conhecimentos. No fundo o que podemos aproveitar do lado de Macau. Estamos a aprender.
– Mas São Tomé sabe que Macau, as entidades locais, têm uma vasta experiência em matéria de turismo e captação de turistas. Em que vos pode ser realmente útil?
M.B.D. – Enquanto relações institucionais, acreditamos que o Governo de Macau, com toda a experiência que lhe é reconhecida na área do turismo, pode ajudar-nos a levar daqui muita, mas mesmo muita experiência e conhecimentos. Uma das áreas com as quais contamos aprofundar relações é na formação, principalmente na capacitação dos nossos quadros e dos nossos jovens na temática do turismo. Podemos aprender e beneficiar muito com a longa experiência de Macau, um território desenvolvido e bem organizado.
– São Tomé já vai tendo alguma população chinesa fixada. Isso pode contribuir de algum modo para divulgar essa imagem do país virado para o turismo?
M.B.D. – É verdade. Já há uma comunidade chinesa instalada nas ilhas. Mas aqui é importante esclarecer uma questão. São Tomé e Príncipe definiu, muito recentemente, a sua nova estratégia de turismo e que é muito clara acerca do tipo de turismo que o país quer desenvolver. E essa estratégia não passa por um turismo de massas.
– Então passa por que tipo de turismo?
M.B.D. – Passa por um turismo mais seletivo. São Tomé e Príncipe quer posicionar-se como um destino exclusivo a médio e longo prazo. Em busca de um turista muito específico. Ou seja, não queremos crescer em número de turistas, queremos aumentar sim, a qualidade do nosso turismo e de quem nos visita.
– Estamos a falar de um turismo sustentável, mais virado para as questões ambientais?
M.B.D. – Exato. Queremos um turismo sustentável, um turismo muito virado para a preservação do meio. Queremos valorizar muito o nosso grande potencial que é o património natural e cultural. Por isso temos um certo constrangimento em relação ao mercado de turismo de massas. Não é o nosso foco, não o queremos captar. Mas tudo isto tem de ser feito com muitas cautelas, uma vez que queremos atingir os nichos que procuramos. Ou seja, Macau e a China serão mercados importantes para nós, mas sempre numa perspetiva de procurar cativar nichos e não número.
– Como está o país em matéria de oferta hoteleira?
M.B.D. – Recentemente inaugurámos mais um resort na ilha do príncipe, um investimento sul-africano que vai na sua quarta unidade (uma em São Tomé e três no Príncipe). Esta nova unidade é de alta qualidade e vai ao encontro da opção por um turismo mais seletivo, mais virado para o exclusivo. Ou seja, elevou a qualidade da oferta que procuramos.
– Para quem conhece São Tomé, não haverá o risco de as duas ilhas – São Tomé e o Príncipe – poderem concorrer na captação desse turismo mais exclusivista?
M.B.D. – Não. Isso mesmo está previsto na nova estratégia de turismo para o país. Nela está bem claro que as duas ilhas devem complementar-se, mas, dentro desse princípio, o Príncipe será a ilha mais seletiva. Estes investimentos no Príncipe estão muito virados para as questões da sustentabilidade, da inclusão social (da população local) em todo o processo. Estão a acontecer ali ações importantes que vão desde a transformação de diversos tipos de produtos, valorização das coisas locais, produção para o consumo próprio das unidades hoteleiras, artesanato, etc.
– Nessa aposta do turismo de nicho, mais virado para as questões ambientais e de preservação, o tal turismo natureza, os responsáveis de São Tomé já conseguiram identificar potenciais mercados aqui na Ásia, sem ser apenas China e Macau?
M.B.D. – Temos de ter em conta que temos uma estratégia orçamental e saber aquilo que é possível fazer. Quisemos partir de uma base muito realista e não estar aqui com sonhos irreais, pelo menos a curto médio prazos.
Isso quer dizer que não olham, para já, para tão longe, para a Ásia?
M.B.D. – Podemos dizer que sim. Nesta primeira fase de relançamento desta nova estratégia estamos focados no mercado europeu, em particular nos países escandinavos e no próprio mercado africano, uma vez que estamos lá e sabemos que ali há uma grande população de expatriados e há já uma população africana com um alto poder de compra. Então estes são, para já, os nossos mercados-alvo. Sempre apontando aos nichos. Numa fase posterior, em função da evolução desta estratégia e de um crescimento que acreditamos vai acontecer, chegará o momento para redefinir objetivos e estratégias.
– Ou seja, para já curto e médio prazos, depois longo prazo. É isso?
M.B.D. – Sim. Temos as ações repartidas entre curto e médio prazos por um lado e longo prazo, por outro. Para o primeiro, os mercados estão perfeitamente definidos. Com investimentos e ações claras para desenvolver. Entretanto, no longo prazo, cabe-nos estudar os possíveis mercados que deverão entrar, posteriormente nas nossas campanhas. E por isso acreditamos que a partir daqui, de Macau e da sua relação com a China, também poderemos captar o turismo que procuramos, obviamente.
– Como Diretora-Geral do Turismo o que é que diz a um investidor ou a um potencial turista?
M.B.D. – Aos investidores, que tenham mais curiosidade, pesquisem mais sobre São Tomé e Príncipe. Estamos muito bem posicionados, em cima da linha do Equador, e oferecemos boas oportunidades. Pedimos sempre para que olhem para nós, não apenas enquanto ilhas, mas para o nosso posicionamento e a nossa proximidade ao continente africano e todo o potencial que existe naqueles países. Para o público final, vejam-nos como um destino emergente, que está a entrar na moda, olhem para as nossas praias lindas, para uma vegetação exuberante e vejam-nos como o destino certo para quem procura umas férias relaxadas.
António Bilrero 04.05.2018