Há vários destinos por cumprir em Macau, a começar pela diversificação económica, pura miragem se a medirmos em Produto Interno Bruto. Já o perfil do emprego pode de facto alterar-se, furando a barreira dos casinos e da Administração, desenvolvendo-se um sector de serviços focado na integração regional e no projeto lusófono chinês. É preciso projetar novos empregos, criar valor e ganhar relevância, muito para além do MICE e das indústrias criativas, setores que vão expondo as suas limitações, apesar de fortemente subsidiados.
Ao deslocar-se a Portugal, o chefe do Executivo, Fernando Chui Sai On, deu à reunião da Comissão Mista um caráter excecional. É certo que não levou nenhum dos seus secretários, nem sequer comitivas de empresários, o que parece uma oportunidade perdida para dar outra verdade e consequência à missão de ser plataforma. Contudo, a receção de alto nível que encontrou em Lisboa, onde foi recebido pelo Presidente da República e pelo primeiro-ministro, revela que a diplomacia portuguesa tem hoje uma consciência muito forte do que pode estar em causa.
Paralelamente, a missão empresarial onde pontuam Kevin Ho, Jorge Valente e Duarte Alves, mostra um apetite pouco habitual na elite local, tradicionalmente resistente a oportunidades de investimento direto. E, contudo, há negócios no ar, alguns deles verdadeiramente estratégicos, que podem colocar Macau num mapa onde nunca antes navegara.
Há muitos anos, Deng Xiaoping explicou a uma enviada norte-americana o erro de perceção mais comum das análises que o ocidente faz da China: “Perdem tanto tempo a descobrir o que não dizemos que não ouvem aquilo que dizemos. E isso é o que vai acontecer”. Está escrito e assumido há muito tempo: o papel de intermediação, a construção de redes, a comunicação transcontinental, a gestão de oportunidades cruzadas tecem o ADN que a China inscreve no futuro de Macau, nomeadamente na sua relação com a economia da língua portuguesa. Vai por isso acontecer. Neste contexto, Portugal não é uma miragem, é a ponte que leva Macau a todas as margens.
Paulo Rego