A taxa de aleitamento materno subiu de 55 por cento, em 2013, para 88 por cento, em 2015, segundo dados oficiais. O Governo propõe a criação de 68 salas de amamentação até ao fim do ano em 15 serviços sob a tutela do secretário para os Assuntos Sociais e Cultura.
As salas para amamentação de bebés vão ser obrigatórias em todos os serviços e entidades públicas e, até ao fim do ano, 68 sob a tutela do secretário para os Assuntos Sociais e Cultura estarão já a funcionar. O objetivo é estimular o recurso ao aleitamento materno, num território onde associações e especialistas se queixam de haver pouca tradição.
De acordo com dados dos Serviços de Saúde, em 2015 nasceram em Macau 5700 bebés entre os quais 5100 (cerca de 88 por cento) foram amamentados por leite materno e mais de 630 (perto de 11 por cento) foram amamentados exclusivamente com leite materno durante quatro ou mais meses.
Até ao final de 2016, além da criação de salas de amamentação, “serão aplicadas medidas para regulamentar a criação obrigatória das salas de amamentação em todos os serviços e entidades públicas”, segundo um comunicado oficial divulgado no mês passado.
O diretor dos Serviços de Saúde do Governo de Macau, Lei Chin Ion, sublinhou a “aposta séria” das autoridades na promoção de aleitamento materno, “incentivando as instituições públicas e privadas a promoverem, em conjunto, iniciativas que visem apoiar as mães trabalhadoras que necessitam de amamentar”.
Segundo o responsável, todos os centros de saúde de Macau têm já salas de amamentação. O Governo espera que estas medidas “sirvam de exemplo” ao setor privado, incentivando as entidades privadas a fazer o mesmo.
Por ocasião da Semana Mundial do Aleitamento Materno — comemorada todos os anos, entre 1 e 7 de Agosto —, o Governo atribuiu louvores a 18 instituições privadas por já terem salas de amamentação.
A luta a favor
Nos últimos anos, parlamentares, associações e outras individualidades do território têm vindo a público exigindo a criação de condições para o aleitamento materno. No início do ano, por exemplo, a deputada à Assembleia Legislativa, Ella Lei, numa interpelação escrita lembrava que a Organização Mundial de Saúde (OMS) considera que a amamentação é a forma ideal de alimentação para um bom crescimento dos bebés e recomenda o aleitamento materno em exclusivo até aos seis meses de idade.
A deputada recordou ainda que a licença de maternidade em Macau se situa entre os 56 dias e três meses, havendo muitas mães a queixarem-se que o regresso ao trabalho as impede de continuar a amamentar de forma regular.
Assim, a deputada pedia lugares apropriados para o aleitamento materno nos espaços públicos, recordando que nos parques, restaurantes, postos fronteiriços e locais de trabalho, as mães são muitas vezes forçadas a amamentar em casas de banho.
Num encontro com o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, que teve lugar no mês transato, a Associação de Amamentação de Macau salientou o preconceito que existe para com a amamentação, segundo se lê em comunicado oficial do Governo. As representantes da associação pediram que o Governo reforce de forma contínua a formação destinada aos profissionais da saúde, de forma a que estes possam divulgar as vantagens da amamentação.
Em Junho deste ano, durante 15 minutos, 60 mulheres amamentaram os seus filhos na Praça do Tap Seac, numa iniciativa organizada pela Associação de Amamentação de Macau e que visa alertar para a importância do aleitamento materno. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, durante o evento, um porta-voz da associação alertou para a falta de locais próprios para proceder à amamentação, realçando que não é higiénico fazê-lo nas casas de banho pública. A Associação pedia ainda ao Governo para obrigar os privados a criarem espaços adequados..
A resistência à amamentação
O hábito, a publicidade ao leite em pó, a licença de maternidade curta e o desconhecimento são os principais motivos apontados pela coordenadora do programa de amamentação dos Centros de Saúde, Beatrice Wong, em entrevista ao PLATAFORMA, para a resistência à amamentação no território.
Entre os 5700 bebés nascidos no ano passado, 88 por cento foram amamentados, mas apenas 11 por cento sem complementar com leite em pó, durante pelo menos quatro meses. Com a Organização Mundial de Saúde (OMS) a recomendar o aleitamento materno em exclusivo nos primeiros seis meses de vida, os números do território são ainda baixos. Para a coordenadora do programa de amamentação dos Centros de Saúde, Beatrice Wong, os motivos passam pelos hábitos enraizados da população, a publicidade “pouco realista” ao leite em pó e a licença de maternidade curta.
Em 2004, os Serviços de Saúde iniciaram o reforço do programa de apoio à amamentação e agora pretendem intensificar as suas atividades. “Até ao final de 2016 serão criadas 68 salas de amamentação em 15 serviços sob tutela do secretário para os Assuntos Sociais e Cultura” e “serão aplicadas medidas para regulamentar a criação obrigatória das salas de amamentação em todos os serviços e entidades públicas”, referia um comunicado oficial divulgado no mês transato.
Realçando que as salas de amamentação irão resolver alguns problemas apontados pelas mulheres, a coordenadora refere que, além disso, “irão continuar a avaliar e seguir a necessidade da população”, de forma a que, no futuro, todos os serviços públicos tenham salas de amamentação, e encorajando o setor privado a fazer o mesmo.
Em paralelo, os Serviços de Saúde irão “reforçar o contacto com as associações” que trabalham no campo social e da saúde, impulsionando a formação e educação, fazendo-se, ao mesmo tempo, mais promoção e divulgação, através de vídeos, cartazes, catálogos, organização de palestras e do trabalho do grupo de apoio materno. Além disso, a linha de apoio telefónico disponível durante 24 horas — que já funciona desde 2013 —, continuará a ser usada, e “todos os anos é enaltecido o trabalho das mães” durante a Semana Internacional de Aleitamento Materno, com a atribuição de louvores às mulheres e entidades.
Para a coordenadora, no futuro, há então que evitar o aumento da “publicidade exagerada” ao leite em pó, ao mesmo tempo em que se promove junto da família a necessidade de apoiar o aleitamento materno.
Combater a mentalidade
Entre as principais razões por detrás do aparente “preconceito” no território em relação à amamentação, a coordenadora discrimina várias. Por um lado, a publicidade “exagerada” os efeitos nutritivos do leite em pó, que assim induz a população a um determinado comportamento. Por outro lado, regressar ao trabalho depois de uma curta licença de maternidade — 56 dias para o setor privado e 90 para o público — acaba por também levar as mães a desistir do aleitamento, dadas as dificuldades em conciliar ambos.
Além disso, há “hábitos” enraizados no território responsáveis pelo desconhecimento dos benefícios do aleitamento materno e que levam a uma crença generalizada de que a amamentação não é tão nutritiva nem capaz de alimentar suficientemente os bebés, acabando por levar à desistência das mães. Acresce a isso que as mulheres sentem dificuldades em amamentar em público, sofrendo “discriminação” ou sendo avisadas para fazê-lo noutros lugares e sendo forçadas a utilizar as casas-de-banho para este efeito.
Assim, numa tentativa de mudar a mentalidade dominante, os Serviços de Saúde irão procurar impedir a utilização de publicidade “pouco realista” que enaltece o leite em pó, salientando os seus benefícios, procurando, ao invés, divulgar junto a população as vantagens da amamentação.
Ainda assim, com a taxa de amamentação a situar-se nos 55 por cento, em 2003, e nos 88 por cento, em 2015, a coordenadora realça o aumento e afirma que é já reflexo do trabalho realizado pelos Serviços de Saúde. Porém, com a OMS a aconselhar o aleitamento materno em exclusivo até aos seis meses, e com apenas 11 por cento dos bebés a cumprirem esta recomendação, em 2015, durante um período de pelo menos quatro meses, os números continuam a ser baixos. “Talvez haja desconhecimento na sociedade, especialmente na chinesa”, diz, realçando que “tem de se divulgar” para que a sociedade saiba que, até aos seis meses, deve haver amamentação em exclusivo. No setor público, além das medidas já anunciadas, a coordenadora realça que “os funcionários públicos têm direito a uma hora por dia para tirar leite”.
As medidas tomadas pelos Serviços de Saúde visam também incentivar o setor privado a criar condições favoráveis à amamentação. Segundo a coordenadora, por ocasião da Semana Internacional de Aleitamento Materno, 18 empresas privadas foram louvadas por terem salas de amamentação. “No futuro, queremos mais empresas privadas com este tipo de salas”, diz.
Realçando que os Serviços e Saúde já iniciaram a criação de condições que “fomentam o aleitamento materno”, através da divulgação de vídeos informativos, cartazes e folhetos, esperando, assim, “encorajar e instruir” o setor privado a apoiar a amamentação.
O início da campanha
Os Serviços de Saúde estão, desde 2004, a promover mais intensivamente o aleitamento materno, tendo arrancado então com determinadas medidas nesse sentido, nomeadamente “a organização de palestras de promoção pré-natal de amamentação, a apresentação periódica de vantagens da amamentação entre mãe e bebe, os métodos e técnicas convenientes, a educação para a saúde na fase pós-parto, o serviço de linha verde de informações e criação de grupo de apoio mútuo ao aleitamento materno”, conforme se lê em comunicado oficial do Governo.
Desde que se iniciou essa promoção, tem havido um crescimento da taxa de aleitamento, passando-se de 55 por cento, em 2003, para 86, 7 por cento em 2013 e 88 por cento, no ano passado. Em 2014, instalaram-se salas de aleitamento materno, de forma a criar um “ambiente mais reservado favorável à amamentação”.
No âmbito das atividades de comemoração da Semana Internacional de Aleitamento Materno, o diretor dos Serviços de Saúde realçou que todos os centros de saúde já possuem uma sala de amamentação.
Por seu turno, a Associação de Amamentação de Macau defendeu que a divulgação das diretrizes dos equipamentos e de gestão da sala de amamentação, elaboradas pelos Serviços de Saúde, irá permitir que mais serviços públicos possam melhorar os espaços que já estão em funcionamento para o efeito, incentivando que mais empresas privadas possam seguir o exemplo.
A Associação de Amamentação de Macau foi constituída em 2013 com o intuito de promover a criação de uma lei que proteja as mães que amamentem em locais públicos. Em várias circunstâncias, a associação tem referido as dificuldades enfrentadas pelas mulheres que querem amamentar em público, frisando que se trata apenas de um bebé a fazer a sua refeição.
O organismo pede ainda que a licença de maternidade seja ampliada e que sejam criadas condições para que as mulheres possam amamentar os seus filhos em espaços públicos. Alertando para a publicidade que se vê na televisão e nos jornais e que consideram enganadora, por realçar os benefícios do leite em pó, a Associação de Amamentação de Macau tem vindo a afirmar, em várias ocasiões, que a sensibilização não ser feita apenas a famílias e empresas, mas também junto dos médicos.
Nos últimos anos, diferentes personalidades têm vindo a defender as vantagens da amamentação, denunciando as dificuldades ainda existentes a esta prática. A deputada à Assembleia Legislativa, Wong Kit Cheng, numa interpelação ao Governo, em meados deste ano, reiterava que na Lei das Relações Laborais devia estar incluído um regime de horas para amamentação, instando o Executivo a fazê-lo, quando proceda à revisão do diploma.
Wong Kit Cheng considera, contudo, que a decisão das mães de amamentar ou não depende não apenas do seu estado de saúde, mas também do apoio e aceitação da sociedade. A deputada referiu ainda que não é satisfatório que existam poucos estabelecimentos com salas de amamentação, instando a que se criem mais.
As dúvidas nas várias línguas
Na altura da amamentação, as dúvidas são muitas, mas o acesso à informação por parte da população que não fala chinês continua a ser escasso.
As mães costumam ligar para a linha de apoio à amamentação com queixas e dúvidas, além de fazerem-no pessoalmente nos centros de saúde. Entre as principais questões que surgem, encontra-se a falta de salas para proceder ao aleitamento materno nos espaços públicos, além de levantarem dúvidas em relação à conservação e ao excesso de leite, e as dificuldades no regresso ao trabalho. Há, porém, ainda pouco acesso a informação noutras línguas que não o cantonês.
“Queixam-se de espaços públicos sem salas”, diz a membro do grupo de trabalho de amamentação e enfermeira do Hospital Conde São Januário, Tang Lai In, ao PLATAFORMA. “Têm de ir à casa-de-banho para amamentar”, esclarece. Além disso, no território, sobretudo entre a população idosa, há quem pense “que o aleitamento materno não é tão saudável”. As mulheres mostram-se ainda preocupadas com o regresso ao trabalho e a manutenção do aleitamento materno, inquirindo sobre pontos como o excesso de leite materno e a conservação no frigorífico.
Do elenco das principais dúvidas referidas na página da Direção dos Serviços de Saúde dedicada à amamentação constam outros pontos, como a relação entre a dimensão dos seios ou o formato dos mamilos e a produção de leite, o período imediatamente subsequente ao parto, os métodos para evitar dores e a postura correta para proceder ao aleitamento. Além disso, diz ainda ao PLATAFORMA a coordenadora do programa de amamentação nos Centros de Saúde, Beatrice Wong, as mães levantam outras questões, como os cuidados a ter com a sua própria alimentação ou os medicamentos que podem ingerir.
Entre os principais serviços de apoio à população no que toca à amamentação, contam-se uma página na Internet — e respetiva aplicação no telemóvel — em chinês, cuja tradução para português está a ser terminada, além de grupos de partilha de mães que organizam sessões nos diferentes centros de saúde. No caso dos não falantes de chinês, apenas podem deslocar-se ao centro de saúde do Fai Chi Kei, onde opera um grupo de partilha, que inclui enfermeiros que se expressam em inglês ou português.
A linha telefónica de apoio, acessível durante 24 horas, por enquanto, é apenas em cantonês. Sobre se há não falantes de chinês a ligar para esse serviço, a coordenadora afirma que, dada a língua de comunicação, “não há, por isso, registo de muitas estrangeiras”. Porém, “se depois da avaliação surgir a necessidade”, Beatrice Wong declara que há a possibilidade de estender a linha de apoio a outras línguas.
Note-se que, desde 2013, está disponível um serviço de tradução para os doentes do Hospital Conde São Januário, acessível através do telefone, e que pode ser solicitado por pacientes dos serviços de urgência e internamento, consultas externas, gabinetes de utentes e serviços de apoio social. Esse serviço abrange 19 línguas, incluindo português, espanhol, malaio, tagalog, bahasa indonésio, vietnamita, japonês, coreano, francês e coreano.
Luciana Leitão