Atrair investidores é uma das batalhas de Timor-Leste, mas existem vários problemas por resolver. O país continua com falta de quadros e a burocracia torna difícil a entrada de novos parceiros internacionais no território.
A Fihir Design e Arquitetura é uma das empresas mais novas de Timor-Leste, um gabinete de design e arquitetura instalado num novo edifício comercial construído num espaço da Diocese de Díli, no centro da capital timorense. Estão paredes meias com duas marcas de cadeias alimentares internacionais, com um restaurante do projeto Casa Vida, de apoio a mulheres vítimas de violência e no meio de um novo espaço de comes e bebes, também aberto há algumas semanas.
Fernando Soares, Tiago Guterres e Flávio Miranda são todos timorenses, alguns viveram bastantes anos em Portugal, trabalharam em Timor-Leste como assessores em várias estruturas do Governo e agora quiseram partir para o setor privado. Um projeto que abriu em março mas que já tem uma agenda cheia de trabalho e que começou mais do que apenas realizar projetos, explica Flávio Miranda, pretende envolver o cliente, quase em jeito de formação.
Flávio Miranda admite que o mercado timorense é “impar” e nem sempre é possível cumprir os padrões desejados, tendo que balançar entre o preço local e a qualidade que o gabinete quer manter. “Queremos que este projeto seja mais do que apenas um gabinete de projetos de arquitetura. Queremos contribuir para disciplinar a construção que é feita em Timor e recuperar a identidade de Timor”, explica Fernando Soares. “Tem vantagem sermos timorenses mas isso não chega. Temos que dar mais valias”, acrescenta.
Tiago Guterres nota que a nível burocrático arrancar com a empresa é fácil – todo o processo foi feito rapidamente – mas aponta os elevados custos, com
“rendas de escritórios a preços de Paris mas com as condições de Timor”. Atrasos nos pagamentos são igualmente outras das preocupações dos empresários, especialmente no que toca ao setor público, com o Governo a demorar até um ano a pagar projetos.
“Os encargos são muito elevados e quando há atrasos para empresas pequenas torna a situação muito complicada”, sublinha Fernando Soares notando que, em alguns casos, e se é preciso ter acesso a materiais de qualidade, por exemplo, o leque de oferta é “bastante reduzido no país” o que ajuda a inflacionar os preços.
Permanecem desafios por resolver
Igualmente preocupante, notam os sócios da empresa, são questões como a falta de lei de terras e propriedades e a necessidade de garantir um sistema de justiça forte e que dê garantias ao investidor.
“É preciso dar mais garantias aos investidores e empresários. Garantir mais celeridade nos pagamentos e melhor formação”, insiste Flávio Miranda. É para responder a estas e outras questões que o Governo timorense está a desenvolver um conjunto de iniciativas que pretendem ajudar a criar um ambiente mais atrativo para investidores internacionais.
Alterações legislativas, aliciantes fiscais, uma reforma educativa e melhorias nas infraestruturas básicas cujo impacto tem sido, para já reduzidas. Mudanças estruturais e conjunturais que, esperam as autoridades, permitam incentivar a economia não petrolífera num país onde 98% dos gastos orçamentais vêm de petróleo e gás natural e o PIB é quase totalmente dominado pelo gasto público.
Os esforços mais recentes incluem alterações às leis de investimento privado no país e a primeira grande reforma fiscal do país, cujos efeitos se começarão a ver apenas nos próximos anos, tal como ocorrerá com a importante lei de terras e propriedades, essencial para qualquer investidor.
Além disso o Governo continua a investir em grandes projetos de infraestruturas, quer de ligação dentro do país quer de ligação entre a ilha e o exterior – portos e aeroportos.
Fórum quer vender o país
Díli acolheu recentemente o 1º Forum Economico da CPLP, um evento que marcou os esforços da presidência rotativa da comunidade lusófona, exercida até junho por Timor-Leste, em tornar a economia um dos principais elementos da agenda dos países de língua portuguesa. O evento reuniu centenas de empresários de dezenas de países interessados, além das oportunidades em Timor-Leste, do papel do país na ponte entre a lusofonia e o sudeste asiático, tendo vários acordos e princípios de acordo sido alcançados.
Avanços, porém, que para muitos não são suficientes para conseguir atrair investidores para Timor-Leste, em particular devido a outras importantes carências do país. Apesar dos esforços na educação da população jovem do país – o Governo está a tentar transformar parte do setor secundário e terciário em formação vocacional e profissional – o país continua a debater-se com um grave problema de recursos humanos.
Os custos de produção – quer os recursos humanos quer outros fatores como eletricidade, importação e exportação, acesso a produtos no fraco mercado nacional – são ainda bastante elevados o que dificulta ainda mais o investimento no país. Incertezas jurídicas, dificuldades de acesso a capital – o setor bancário do país destaca a falta de garantias para aumentar o acesso a crédito – são outros dos problemas que condicionam o investimento no país.
Para a organização não-governamental timorense La’o Hamutuk o debate deve ser ainda mais amplo, não bastando ao Governo procurar implementar critérios da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) ou da Convenção de Comércio e Desenvolvimento da ONU (UNCTAD) que podem, sugere, ser até pouco benéficos para Timor-Leste a curto e médio prazo. Em recentes sugestões remetidas ao Governo a La’o Hamutuk considera que qualquer política de atração de investimento deve ser desenvolvida com “planeamento cuidado, liderança e regulação” para garantir os efeitos positivos de qualquer investimento estrangeiro no país e minimizar potenciais impactos negativos.
“Investimento privado é um caminho, não um destino”, sublinha a ONG, num documento de análise das atuais políticas de estímulo ao investimento privado em Timor-Leste. Entre outros aspetos, a organização lamenta que as propostas de lei se referiram apenas aos potenciais da agricultura orientada para a exportação, considerando que deveria promover agricultura biológica e a produção para consumo doméstico.
Manufatura e turismo, nota, são outros setores que deveriam ser contemplados para reduzir a dependência externa do país. “Timor-Leste precisa de lidar com os seus maiores obstáculos – recursos humanos, terras, garantias de contratos e infraestruturas sustentáveis e adequadas. Tentativas no passado mostram que cortar impostos ou simplificar o registo de empresas não foram suficientes para atrair investidores”, refere o estudo, que aponta também o impacto na corrupção do país.
António Sampaio