Início Uncategorized Andrew Sheng , Xiao Geng * – OS RISCOS DO SUBPRIME DA CHINA

Andrew Sheng , Xiao Geng * – OS RISCOS DO SUBPRIME DA CHINA

 

Apesar de ter um balanço forte e uma grande liquidez no banco central, a China enfrenta um problema localizado no subprime, que se deve em parte a um nível elevado de exigência de reservas.

 

É agora globalmente aceite que a recente crise financeira foi, na verdade, uma crise de balanços. Longos períodos de taxas de juro negativas permitiram e facilitaram o financiamento insustentável da compra de ativos, com hipotecas de alto risco a enfraquecer os balanços nacionais. Quando a liquidez nos principais mercados interbancários secou, as fragilidades foram expostas – e com consequências devastadoras.

Atualmente, a rápida expansão dos balanços das instituições financeiras chinesas – que cresceram 92% entre 2007 e 2011, enquanto o PIB nominal expandiu 78% – está a alimentar rumores de que a China vai, em breve, ter a sua própria derrocada do subprime. Mas haverá algum fundo de verdade nessas previsões? O primeiro passo para avaliar a vulnerabilidade financeira da China passa por distinguir uma crise de solvência, que pode ocorrer quando as empresas não têm capital suficiente para aguentar o colapso do preço dos ativos, de uma crise de liquidez. Alguns países sofreram crises cambiais durante a crise financeira asiática de meados dos anos 1990, porque a desvalorização e as altas taxas de juro descapitalizaram os bancos e empresas, devido à falta de reservas suficientes para cobrir as dívidas cambiais.

No caso do colapso dos preços dos activos no Japão, em 1989, e igualmente nos EUA em 2008, a re- capitalização dos bancos e a liquidez dos bancos centrais ajudaram a restaurar a confiança do mercado. O recente relatório “Balanços Nacionais”, divulgado pela Academia Chinesa de Ciências Sociais (CASS, no acrónimo em inglês), sugere que é pouco provável que a China atravesse uma crise cambial ou uma crise de insolvência. No final de 2011, os ativos líquidos do governo central ascendiam a 87 biliões de yuan (14 biliões de dólares), ou 192% do PIB, dos quais 33 biliões de yuan eram relativos a ações detidas em empresas públicas. Além disso, no final do ano passado, a posição líquida da China em divisas estrangeiras era de 2 biliões de dólares – 21% do PIB, com as reservas brutas de divisas a totalizarem pouco menos de 4 biliões de dólares.

O que preocupa é a crescente dívida doméstica chinesa, que vale atualmente 215% do PIB. Desde 2008, as empresas públicas e as chamadas plataformas de financiamento dos governos locais têm recorrido a crédito para financiar investimentos massivos em ativos fixos, enquanto que o setor privado tem estado a pedir empréstimos – muitas vezes ao setor bancário paralelo – para financiar investimentos no sector imobiliário. Esta dependência excessiva do crédito tem origem na falta de financiamento adequado e no relativo sub- desenvolvimento dos mercados de capitais chineses, com a capitalização de mercado a ascender a apenas 37% do PIB, o que compara com 104% do PIB nos EUA.

A dívida detida por empresas não financeiras atinge 113% do PIB na China, face a 72% nos EUA e a 99% no Japão. Mas tendo em conta que as maiores empresas ou são públicas ou pertencem aos governos locais, as respetivas dívidas consistem essencialmente em obrigações soberanas domésticas. Uma vez que o rácio entre a totalidade da dívida do governo e o PIB é de apenas 53% – muito menos que os 80% dos EUA e os 226% do Japão – há margem suficiente para apostar na conversão de dívidas em capital para assim enfrentar o problema interno da dívida. Claro que os líderes chineses também vão precisar de fazer grandes reformas orçamentais, incluindo uma melhor partilha de receitas entre o governo central e os governos locais.

A longo prazo, as autoridades devem aplicar uma regulação mais rígida para garantir que os investimentos em infraestruturas dos governos locais são sustentáveis e não dependem excessivamente dos proveitos da venda de terras. Durante o período de transição, o fardo do ajustamento vai ficar, em grande medida, concentrado na política monetária, algo que será especialmente desafiante tendo em conta a “rigidez” estrutural de liquidez nos setores mais produtivos.

De 2007 a 2011, a produção de massa monetária aumentou 116%, enquanto que as reservas cambiais aumentaram 180%. O excedente foi absorvido através de requisitos estatutários de reserva que ascendiam até 20% dos depósitos bancários. Como o sistema bancário oficial estava com este tipo de problemas, o crédito restante foi transferido para grandes empresas e para quem tivesse colaterais suficientes, o que resultou numa distribuição desigual de empréstimos pelas diferentes regiões e sectores. Em resultado disso, as grandes empresas – na sua maioria empresas públicas, que gozam de subsídios financeiros consideráveis e de liquidez – eram responsáveis por 43% do total dos empréstimos bancários em 2011; as pequenas e médias empresas, que enfrentam dificuldades de financiamento, incluindo custos elevados de crédito e pouca liquidez, detinham apenas 27% dos empréstimos. Isto realça duas necessidades estruturais fundamentais. Em primeiro lugar, as empresas públicas e os governos locais devem ser encorajados a não investir demais, porque isso fragiliza a taxa de retorno. Em segundo, as PME e as regiões em rápido crescimento devem receber mais capital, porque é mais provável que criem emprego e inovação.  Por outras palavras, as reformas na taxa de juro devem ser alcançadas ao mesmo tempo que se fazem as reformas no mercado de capitais para au- mentar o acesso ao crédito por parte dos sectores mais produtivos.

A China não pode passar de uma economia virada para as exportações para uma economia impulsionada pelo consumo doméstico e pelos serviços sem que a criação de valor através da inovação compense a destruição de valor provocada pelo excesso de capacidade.

Em resumo, apesar de ter um balanço forte e uma grande liquidez no banco central, a China enfrenta um problema localizado no subprime, que se deve em parte a um nível elevado de exigência de reservas.

A recente libertação, por parte do banco central, de um bilião de yuan em liquidez, através de um empréstimo direto ao Banco de Desenvolvimento Chinês, para a reconstrução de bairros de lata, é uma medida prometedora porque cumpre a necessidade de fazer investimento socialmente inclusivo. Ao contrário da Reserva Federal norte-americana, o banco central chinês não adquiriu hipotecas do subprime. A chave para o sucesso vai passar por gerir as diferentes injeções de liquidez e as reformas das taxas de juro de modo a que os esforços para combater as dívidas de subprime locais não provoquem uma desvalorização do preço dos ativos.

Ao mesmo tempo é essencial reduzir a repressão financeira que fecha a torneira do crédito aos sectores e regiões mais produtivos. Se conseguir fazer bem estas reformas estruturais, a China – e o resto do mundo – vai ser capaz de evitar as consequências de uma travagem brusca da economia.

 

*Membro do Fung Global Institute e do Conselho Consultivo de Finanças 

Sustentáveis da UNEP. Director de 

Investigação no Fung Global Institute

Exclusivo Savana/Plataforma Macau

 

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